“Oi! Ouvi sobre uma peça hoje na rádio e me interessou. Anima ir comigo?”: foi a mensagem que recebi de uma amiga. E assim, nesse acaso, acabei conhecendo o que já vem a ser um dos meus lugares favoritos em Belo Horizonte. Mas, calma. Eu não vou escrever sobre um bar inovador que chegou em 2017 na cidade. Quer dizer, vou também. Mas só porque a experiência incrível da minha quinta à noite envolve tudo: o ambiente, o atendimento, a comida e, principalmente, as micropeças!
Como as boas mineiras e moradoras de Belo Horizonte que somos, achamos normal que a peça fosse apresentada em um bar, afinal, o que não vira bar nessa cidade? Chegando na porta, nos deparamos com uma casa de construção antiga que, com muita criatividade, se transformou em um bar e em um espaço inusitado para peças teatrais: são três salas (ou quartos) para as apresentações, nomeadas com homenagens a artistas do universo cênico. Fomos para ver uma peça específica e em menos de 5 minutos já estávamos com o trio de ingressos da noite em mãos. Sobre nada mais queríamos conversar, a não ser explorar e entender que tipo de espaço cultura a gente tinha encontrado ali.
Por mais encantada que eu esteja com tudo o que vivi e senti nesse lugar — e esteja louca para contar —, vou deixar para que vocês tirem suas próprias conclusões. E para convencer sua visita, deixa eu falar um pouco das micropeças (com duração média de 15 minutos e cerca de 15 lugares disponíveis) assistidas:
A primeira foi “Entre por essa porta agora”, com concepção e atuação do ator e diretor Odilon Esteves. Essa é a história de um homem que espera a visita de alguém e tudo começa com ele escrevendo uma carta para essa pessoa. Diferente da ideia de o ator entrar em palco, nós é que entramos em seu cenário, como parte dele: com direito a interação e tudo! A atuação foi de uma consistência tão grande que em determinado momento me senti uma intrusa na vida do personagem, enclausurado. O roteiro é uma adaptação do conto “Carta para além do muro”, de Caio Fernando Abreu: nada como um conto para dar vida a uma micropeça, não é mesmo? A peça também conversa com outras referências, bem como a música “Vambora”, de Adriana Calcanhoto — agora imagina uma sala com todos os espectadores cantando essa música: isso aconteceu. E foi lindo!
Saindo dessa performance, estava extasiada. Tinha encontrado um lugar pra frequentar semanalmente. Tive uns 20 minutos pra me recompor — e estava só começando. A segunda foi “Guardo meus rancores com o maior carinho”, com o ator Gu Freitas. Com cenário e figurino impecáveis, o monólogo expressa temas psicológicos comuns a qualquer indivíduo e se desenvolve para o que vem a ser uma relação entre paciente X psicólogo. O texto foi uma adaptação livre — feita pelo próprio ator — do conto “Sala de espera”, de Elisa Palatnik, contendo citações de Karine Alexandrino e Bruce Lee e com adição de uma pitada de humor ácido. Diferente das outras duas apresentações da noite, essa micropeça não foi exclusividade do La Movida, tendo sua estreia em 2015, no festival “A-Mostra.Lab”. Tudo muito bem construído, do início ao fim! Citando livremente uma frase dita por Gu ao longo da peça, “Para se erguer precisamos de Freud, e Freud custa caro”, então, por questão de custo X benefício é que recomendo: vá ao microteatro!
Já descontraída do choque da primeira apresentação, e agora bastante à vontade naquele ambiente, esperamos mais alguns minutos para a terceira e última micropeça da noite: “Sala de esquecer”, com Raquel Pedras e Cristiano Araújo. O texto é próprio dos atores e eles falam sobre a vida. Mas não de uma maneira superficial; a profundidade é tanto que é inevitável pensar, também, na morte. Com um cenário enigmático e simples — mas incrivelmente expressivo — e um jogo de luz perfeito, os atores nos envolvem em suas reflexões sobre o conceito de lembrança, memória e a ânsia de viver. O roteiro, as atuações e principalmente o ambiente intimista nos sufocam: mas um sufoco benéfico, por assim dizer. Como as demais micropeças do dia, não faltaram sensações como me faltam, agora, palavras para descrever tal experiência!
Foi depois de conhecer o conceito de microteatro, na Espanha, que a publicitária e produtora cultural Clarice Castanheira e o ator Guilherme Théo criaram o La Movida Microteatro Bar, no bairro Funcionários, dando uma cara boêmia e versátil que a nossa cidade tanto merece — e gosta muito! O local fica aberto de quinta a domingo, na parte da noite, o preço das micropeças e do cardápio é bastante justo e o atendimento é de primeira. Aconchego, receptividade e inspiração foi o que senti e, por isso, recomendo altamente uma visita ao La Movida! A gente se encontra lá!