A PEQUENA CASA

Crítica: A Pequena Casa – Mostra de SP

A PEQUENA CASA

38ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo #27

Nos últimos anos, o cineasta japonês Yôji Yamada tem se revelado o maior discípulo contemporâneo do mestre Yazujiro Ozu, dirigindo dramas familiares povoados por pessoas honestas e bem intencionadas cujos problemas surgem dos pequenos desafios da convivência rotineira – mas se em Uma Família em Tóquio, sua refilmagem do clássico Era uma Vez em Tóquio, Yamada levou sua reverência a Ozu ao extremo, neste A Pequena Casa há uma tentativa, ainda que leve, de situar sua história em um contexto histórico maior, resultando em um longa irregular que se sustenta basicamente pela delicadeza de sua abordagem e pela triste figura que sua protagonista representa.

Tendo início com uma espécie de prólogo em que familiares de uma senhora recém-falecida separam os objetos deixados por ela entre aqueles que serão utilizados e aqueles que irão para o lixo, o longa logo entra em um flashback em que a idosa (Baishô) é vista escrevendo seu livro de memórias ao lado do neto Takeshi (Tsumabuki) – e é quando entramos num novo flashback que passamos a conhecer sua história: mudando-se para Tóquio para tentar mudar de vida durante o período de rápido crescimento e abertura econômica que o Japão atravessou entre as duas Grandes Guerras, Taki (“agora” vivida por Haru Kuroki) é contratada para trabalhar como empregada doméstica do casal formado por Tokiko (Matsu) e o Sr. Hirai (Kataoka), tendo sua vida mudada com o início da amizade daquela família com o simpático professor Shoji (Toshioka), que logo se transforma em sua paixão platônica.

Curiosa por contar a história de Taki colocando-a como coadjuvante de sua própria vida (o que justifica os diversos momentos em que a atenção do longa se desvia dela para acompanhar acontecimentos paralelos vividos por outros personagens – como na peça que sua patroa vai assistir ao lado de Shoji enquanto a protagonista permanece “invisível” cuidando de seu filho pequeno), a abordagem adotada por Yamada é a do melodrama de época, buscando em Ozu a inspiração para tentar discutir temas como as mudanças culturais causadas pela ação do tempo e pelas transformações enfrentadas pela sociedade japonesa e falhando, como acontece em muitos filmes do gênero, por não conseguir guiar a narrativa para um grande clímax, permanecendo no mesmo “tom” ao longo de seus 136 minutos de projeção.

Filmando na maior parte do tempo em internas e através de uma câmera discreta que permanece ora estática ora fazendo movimentos suaves e apenas funcionais, Yamada investe em closes e inserts de partes/objetos pertencentes à casa-título para criar no espectador uma sensação de familiaridade com o local que será determinante para compreendermos as decisões tomadas por Taki no terceiro ato da projeção, sendo prejudicado por uma trilha sonora clichê que se esforça constantemente para emocionar o espectador e por uma narração em off intrusiva cujo objetivo óbvio é conferir um tom épico à trama, mas que consegue apenas torná-la mais previsível.

Jamais investindo no claro subtexto lésbico que permeia a relação entre Taki e Tokiko, A Pequena Casa acaba funcionando relativamente bem pela doçura com a qual Yamada costuma tratar seus personagens, que, por mais que vez por outra tomem decisões que não são as melhores, parecem sempre dispostos a acertar da próxima vez.

A Pequena Casa (Chiisai Ouchi, Japão, 2014). Escrito e dirigido por Yôji Yamada. Com Haru Kuroki, Satoshi Tsumabuki, Hidetaka Yoshioka, Takako Matsu, Chieko Baishô, Takatarô Kataoka, Yui Natsukawa e Kazuko Yoshiyuki.