Acabou. Com esse review se encerra a nossa cobertura especial da série de humor negro Scream Queens. Ao longo de seus 13 episódios, a série demonstrou irregularidade e dificuldade em sustentar o ritmo engraçado, politicamente incorreto, sarcástico e narcisista que apresentou na maioria da temporada. Mesmo assim, muito por causa do carisma dos seus personagens, Scream Queens encerra seu primeiro ano de uma maneira digna e com a cabeça erguida.
Muito corajoso existir uma série capaz de tanto desapego com os bons modos. Nenhum personagem de Scream Queens é santo ou livre de qualquer suspeita. Todos possuem seus crimes, mas ainda assim, apenas alguns deles receberam a punição justa. O roteiro foi implacável com a chamada justiça divina e mostrou que pessoas como Chanel acabam sendo seus piores inimigos (vide a cena do julgamento, quando a jurada vai ler a sentença e muda de ideia depois de ouvir desaforos). Depois de 13 episódios destilando todos seus preconceitos e desvios morais, a personagem de Emma Roberts encontra a sua paz num sanatório.
Ainda não há nenhuma garantia oficial da Fox em garantir o segundo ano de Scream Queens, embora as conversas já estejam ocorrendo há algum tempinho. Caso a série não retorne (o plano é imitar o que True Detective e Fargo fizeram, com uma trama 100% diferente), fica a sensação de dever cumprido com uma temporada recheada de mortes sangrentas e que acabou sofrendo com a rejeição do público slasher que não se sentiu representado por uma egocêntrica como Chanel e para o público normal, que não aprecia a tanta violência na televisão. Como um fã do gênero (e de piadas crueis), Scream Queens me conquistou exatamente pela falta de humanidade de sua protagonista e o jeito como o dinheiro a transformou numa sociopata que vive numa realidade alternativa. Mais do que as homenagens aos clássicos de terror ou ao mistério sobre a identidade da assassina, o trunfo está na perigosa inocência e prepotência de Chanel Oberlin.
“The Final Girl(s)” começa com a voz de Hester confirmando que ela é a assassina, como a investigação de Grace e Zayday revelou. Temos todo um flashback sobre a sua história, detalhes sobre seu treinamento e o que a motivou para cometer tantos crimes – ou estimular o irmão, numa alusão que seria quase perfeita ao “serial killer” Charles Manson, que foi preso sem nunca ter matado alguém de verdade. Hester e seu jeitinho de sonsa dissimulada despeja mil acusações sobre Chanel e suas comparsas, que acabam levando a culpa. Numa série em que todos são cheios de segredos, ninguém ousou questionar a firmeza com que as acusações apareciam.
O episódio brinca com a passagem de tempo indo para o passado, presente e até o futuro (que revela uma nova fraternidade liderada por Zayday, Grace e a própria Hester), mas não tropeça na narrativa para causar qualquer confusão nas mentes de seus telespectadores. Paralelamente ao que que acontece no campus, temos o julgamento e a condenação de Chanel. Ao serem levadas para um sanatório, o trio passa a viver melhor, inclusive se alimentando adequadamente (“não existem garotos para você ficar magra”), o que é só mais uma das várias críticas que o roteiro faz para o comportamento imposto pela mídia. Quanto mais alienado e conectado você for (irônico), “melhor” é a sua vida. Na internação, as garotas descobrem que podem ser felizes longe das regras dos padrões de beleza e comportamento.
A falta de noção característica de Scream Queens, tão comum nas narrações de Oberlin, é substituída pelo discurso inflamado de Hester e sua disposição em provar que as três loiras são as assassinas. Ela contrata um casal de atores de segunda categoria para fingirem ser seus pais e mesmo depois do cara ser reconhecido, ninguém suspeita de que tudo pudesse ser uma farsa. Essa simplicidade ou evocação do mundo das fantasias é algo apaixonante nesse roteiro. Não precisamos de explicações lógicas, precisamos apenas de um desenvolvimento narrativo que acompanhe a lógica interna maluca da série.
Até parecia que Scream Queens finalmente teria um episódio em que o Demônio Vermelho passaria em branco, mas como disse, a relação com Manson não é perfeita porque Hester matou Pete e provavelmente está por trás da suposta morte de Oberlin. Se é que tudo não passou de um delírio psicótico pensado como um encerramento com chave de ouro da temporada.