PARA APRECIAR UM FILME DE MÁGICA VOCÊ PRECISA NECESSARIAMENTE GOSTAR DE MÁGICA? No final das contas pouco importa se você gosta de truques ilusionistas, pois Truque de Mestre é um daqueles filmes dignos da sessão da tarde: é tudo tão no piloto automático, sem nenhuma pretensão de ser levado à sério como entretenimento inteligente e indispensável, que acaba sendo impossível não se divertir ao mergulhar no thriller estrelado por Jesse Eisenberg (Zumbilândia), Mark Ruffallo (Os Vingadores), Isla Fischer (O Grande Gatsby), Melanie Laurent (Bastardos Inglórios), Dave Franco (Meu Namorado é um Zumbi) e Woody Harrelson (Zumbilândia), e com direção de Louis Leterrier (Fúria de Titãs).
Seguindo a fórmula de diversas obras que tentam reunir personagens independentes e fortes para trabalharem juntos com um grande objetivo (como o já citado Os Vingadores ou 11 Homens e um Segredo), a trama coloca quatro talentosos ilusionistas realizando crimes incríveis e deixando os investigadores intrigados com o alto nível dos golpes. Daniel Atlas (Eisenberg) é o jovem líder arrogante, cuja ex-assistente Henley (Fischer) se especializou em truques mais arriscados e começou a fazer sucesso sozinha; Merritt (Harrelson) é o único com um talento realmente interessante e mexe com o inconsciente de suas vítimas; e por último temos o jovem Jack Wilder (Franco), que é um talentoso ladrãozinho safado que fica babando com a oportunidade de trabalhar ao lado de pessoas que ele sempre admirou. Do outro lado, temos o investigador com uma aparente condição de ressaca permanente Dylan Rhodes (Ruffalo) e sua inexperiente parceira francesa Alma Dray (Laurent).
O roteiro foi fruto do trabalho de cinco pessoas, o que os leitores assíduos do Cinema de Buteco já sabem que significa um enorme potencial desastroso em termos técnicos, e escorrega em diversas cenas ao simplesmente empurrar para o espectador que aquelas pessoas são mágicos de verdade. E pronto. Após terminar o filme, discuti um pouco com o amigo Eduardo Monteiro (editor do Cinema sem Erros e colaborador do Buteco), e ele revelou o quanto se sentia incomodado com essas situações e eu concordo com ele. Mas como considerei Truque de Mestre como um mero passatempo para o intelecto dos espectadores mais calejados, a ausência de verossimilhança pouco me irritou ou dificultou a minha concentração na trama. Parte disso pelo carisma dos protagonistas e da maneira surpreendente como algumas situações mais engraçadas funcionam. Esse humor apenas reforça a comparação com uma daquelas obras divertidas e descompromissadas que tantas vezes prenderam nossas atenções enquanto assistíamos a televisão nas tardes de nossas infâncias.
A trama tenta incluir certo suspense na medida em que pistas são reveladas sobre a existência do verdadeiro líder dos Quatro Cavaleiros, alcunha do quarteto fantástico – ou mágico – em questão. Tudo bem que a revelação implica em um grande esforço do espectador para aceitar a verdade, mas Truque de Mestre não estabelece um compromisso fixo com noções de razão, sentido ou de realidade. É uma fantasia de roubo e aprendizado, com um grupo de ilusionistas delinquentes dispostos a serem reconhecidos e aceitos por um mágico lendário e aparentemente com verdadeiros talentos sobrenaturais, o que seria até convincente para o resultado final. É uma pena que o roteiro não tenha dado nenhuma chance do próprio espectador tentar adivinhar a identidade do “verdadeiro mágico” do filme, e que tenha que se contentar com uma mera explicação bobinha e pronto. No final das contas, são detalhes que passam batido para muitos espectadores, mas que deixam um certo desconforto para aqueles que buscam refletir sobre as mensagens da obra. A mensagem de Truque de Mestre poderia ser digna dos ensinamentos de Aleister Crowley: “Faz o que tu queres, há de ser tudo da lei.”
Eisenberg comprova que é um excelente ator de um personagem só. Daniel Atlas pode ser um ilusionista talentoso, mas que em momento algum consegue fugir da sombra de Mark Zuckerberg, o criador do Facebook interpretado brilhantemente por Einsenberg em A Rede Social, de David Fincher. As principais características do melhor momento da carreira do ator estão presentes em Truque de Mestre: a arrogância, inteligência acima da média, o sarcasmo, o humor seco e quase cruel, além das próprias expressões de Eisenberg. Apesar desse “pequeno” probleminha, ele é o melhor ator do grande elenco reunido para o longa-metragem e deixa para trás até mesmo Michael Caine e Morgan Freeman, que estão no piloto automático para cumprir o acordo e poder pagar o aluguel no final do mês. Aliás, Freeman estava tão empolgado com o lançamento do filme que até chegou a dormir durante uma entrevista de divulgação. Tentei evitar qualquer comentário acerca das fortes presenças femininas, mas não resisti: Mèlanie Laurent é de um charme absurdo (e incrivelmente inocente, o que só reforça a sensualidade “acidental” de sua personagem) e se algum produtor resolvesse fazer um filme sobre ela e buscasse recursos com algum Crowdfunding, eu seria um dos principais investidores.
Se não é um sucesso inquestionável, pelo menos Truque de Mestre tenta colocar o nome do cineasta Louis Leterrier de volta ao jogo após o crime cinematográfico conhecido como Fúria de Titãs. Leve, extremamente divertido, com direito até a uma reviravolta no final que não faz o espectador de otário (ao contrário do que aconteceu recentemente em Homens de Preto 3, por exemplo), e com um elenco afinado e com uma química envolvente, o thriller de humor é bom o suficiente para rir sem culpa enquanto acompanha um bando de mágico bancando o Robin Hood da nova geração. Entretenimento descartável, mas divertido.
Nota:[tres]