Crítica: Tortura do Medo (1960)

COMO O SAUDOSO ROGER EBERT AFIRMA EM SUA CRÍTICA DE Tortura do Medo (Peeping Tom, 1960), o cinema é realmente uma arte que nos transforma em verdadeiros voyeurs. Confortavelmente observamos atores e diretores dando vida para histórias e nós estamos numa posição privilegiada para acompanhar a rotina e os acontecimentos na vida dos personagens.

O longa-metragem foi lançado em 1960 e conta a história de um cinegrafista que começa a matar mulheres e filmar as suas expressões de terror pouco antes de serem assassinadas.

Como grande fã do gênero terror, me sinto um pouco desconfortável com a proposta da obra. Nos minutos iniciais temos uma bela sequência em POV (Point of View), em que acompanhamos a ação através das lentes da câmera do psicopata Mark Lewis (Karlheinz Böhm). Esse recurso também nos coloca na pele do próprio psicopata. É como se aquela primeira morte nos tornasse assassinos junto de Lewis. Nós participamos daquilo. Mais recentemente, o longa-metragem Maniac, com Elijah Wood, nos faz sentir a mesma coisa.

Peeping Tom - Filmes com Psicopatas

O roteiro de Leo Marks é inteligente e conquista os espectadores com personagens bem construídos e com boas inserções metalinguísticas, afinal estamos assistindo a um filme em que a câmera possui grande importância. O nosso protagonista vive com o grande trauma de ter servido como cobaia para as experiências do seu pai psiquiatra e aprecia usar a câmera para capturar o medo na expressão de suas vítimas. Mais do que tirar uma vida, a sua verdadeira necessidade é registrar o que as pessoas sentem pouco antes de morrerem. Para isso, ele usa um espelho que reflete a própria imagem de suas vítimas pouco antes de morrerem. Como espectadores, é extremamente incômodo acompanhar uma história em que o personagem principal que usa a câmera para registrar a dor. Pesado.

Se Michael Powell não fosse um desafeto da crítica londrina (que massacrou a obra e quase acabou com a carreira do cineasta), talvez Tortura do Medo não recebesse tantas críticas negativas dos “especialistas” da época. Curiosamente, meses depois do lançamento de Tortura do Medo, Alfred Hitchcock levaria aos cinemas o seu maior clássico Psicose. Os dois filmes possuem muitas coisas em comum: além de psicopatas marcantes, também trabalham com traumas de infância. Se Norman Bates sofreu com sua relação materna, Mark Lewis teve péssimas experiências com o seu pai.

Um filme bem A frente do seu tempo, Tortura do Medo foi “ressuscitado” das cinzas por Martin Scorsese, um fã declarado do trabalho de Powell e que apresentou o longa-metragem para uma geração bem mais preparada para entender melhor a profundidade da obra. Fãs de voyeurismo que tinham em Janela Indiscreta a sua obra de cabeceira ou Brian De Palma como principal referência precisam dar uma chance para esse clássico do cinema.

Tortura do Medo está na nossa lista de 50 melhores filmes com psicopatas.