Filme: Quadrilha dos Sádicos (1977)

Quadrilha dos Sadicos

O ESPECIAL COM A FILMOGRAFIA DE WES CRAVEN CHEGA AO SEU MOMENTO MAIS IMPORTANTE, pelo menos se tratando da minha participação. Nunca é fácil escrever sobre nossos filmes favoritos, como é o caso de Quadrilha dos Sádicos (The Hills Have Eyes, 1977), mas precisamos pelo menos tentar, não é mesmo?

Mesmo reconhecendo A Hora do Pesadelo  como a obra-prima do cineasta, existe algo em Quadrilha dos Sádicos que me agrada demais. Acredito que seja a maneira como Craven conduz a tensão e o medo. Ele utilizaria o mesmo recurso (com maior eficiência) em A Hora do Pesadelo, mas é certo que evitar mostrar a ameaça aos espectadores ajuda a construir um clima maior de suspense. Craven nos convida a imaginar, algo que o cinema de horror moderno parece incapaz. (Leia mais sobre isso na crítica de Tubarão, de Steven Spielberg)

A trama apresenta uma família viajando de carro pelo deserto e sofrendo um acidente depois de pegar um desvio. O que eles não imaginam é que estão em território hostil, com uma família de canibais à espreita e preparados para fazer o que for necessário para se alimentar.

A premissa é interessante porque nos faz pensar além do que é mostrado em cena. É claro que teremos uma conexão com a família bonitinha e que se parece conosco, os Carter. Vamos torcer por eles e encarar os canibais como uma verdadeira ameaça – e eles realmente são, mas não deixam de ser uma outra família humana, com seus valores, crenças e necessidades. A grande sacada do roteiro, a partir do terceiro ato, é inverter os valores/posições na narrativa e colocar os nossos protagonistas em ações ainda mais violentas daquelas que sofreram. Tudo em nome da vingança. Craven transforma essa família em criaturas tão ou mais irracionais quanto os infelizes canibais. Mais interessante é que, enquanto a família de Júpiter ataca na escuridão e impede os espectadores de acompanharem todas as suas atividades, Craven mostra a vingança dos Carter em plena luz do dia. Justamente para não deixar que o público escape da sede de sangue e vingança que domina os personagens.

Para chegar nesse ponto máximo da sua crítica, Craven tropeçou bastante. Não podemos negar. O roteiro é recheado de situações absurdas, que vão desde o machismo de Big Bob, um policial aposentado que se acha acima da lei e das regras, ainda que isso signifique levar um bebê para um local que serviu de testes do exército e pode conter radiação; até a bizarra maneira de uma personagem de lidar com o medo trepando com o marido. Digamos que o desenvolvimento dos detalhes não seja algo que tenha recebido a atenção de Craven, que prioriza apenas os momentos chave da narrativa, como a cena em que os canibais invadem o trailer e tentam estuprar a filha mais nova de Big Bob. É um momento desconfortável e Craven ainda pegou leve, já que boatos afirmam que a sequência filmada originalmente foi editada para o longa-metragem não ter (muitos) problemas na censura.

A trilha sonora também merece uma atenção especial. Craven usa ela com sabedoria para conciliar momentos de sustos e aproveita para dar importância maior para sons diegéticos, como uivos e o barulho do vento no deserto. Tudo contribui para um clima de tensão ainda maior.

Violento e com viradas marcantes, Quadrilha dos Sádicos é um verdadeiro filme sobre família e os limites que podemos cruzar para garantir a nossa segurança diante ameaças que não conseguimos entender bem. E nem queremos, na verdade. Craven repete o ato final de seu debut Aniversábrio Macabro e mais uma vez dá a mensagem que os conservadores de direita tanto gostam: dente por dente, olho por olho.

Quadrilha dos Sádicos ganhou uma refilmagem nos anos 2000. Com direção de Alexandre Aja, Viagem Maldita surpreende positivamente e consegue até superar o original no que diz respeito à violência.