Critica A Caverna terror espanhol

Crítica: A Caverna – Mostra de SP

 38ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo #22

Critica A Caverna terror espanhol

Quem acreditava que seria impossível surpreender o espectador com um terror de caverna após Abismo do Medo estava enganado: em A Caverna, o cineasta espanhol Alfredo Montero cria um found footage tenso e claustrofóbico que, aproveitando-se positivamente do desgaste que o subgênero tem enfrentado na última década ao utilizar todas as suas convenções a seu próprio favor e assim economizar tempo, choca o público não por apresentar uma grande reviravolta ou um insight particularmente original, mas por usar o horror visual para comentar um aspecto da natureza humana que nós normalmente preferimos ignorar.

Tirando o fim de semana para se isolar da sociedade em uma praia paradisíaca, um grupo de amigos (interpretados por Marta Castellote, Xoel Fernández, Eva García-Vacas, Marcos Ortiz e Jorge Páez) encontra uma caverna estreita e, claro, logo resolve explorá-la. Não demorando muito para se perceberem perdidos, os jovens ainda tem que lidar com a súbita crise de pânico de uma de uma de suas participantes, que, incapaz de pensar racionalmente, torna-se um fardo pesado demais para ser carregado dali em diante – e à medida em que o tempo passa e o cansaço, a fome e o pavor aumentam, eles precisam começar a pensar em uma saída para não morrerem logo e continuarem buscando uma saída daquele labirinto úmido e cada vez mais escuro quando a bateria de lanternas e celulares começa a chegar ao fim.

Desde os primeiros minutos de projeção, os personagens do longa não conseguem esconder que, incapazes de demonstrar peculiaridades que os diferenciem um do outro, não passam daqueles jovens imbecis e inconseqüentes que nos acostumamos a ver não apenas em filmes de “fita encontrada” como este, mas, muito antes, nos slasher movies dos anos 70 e 80 – e quanto mais estúpido, fraco ou “imoral” o personagem é, maior também é a expectativa de que ele seja uma das primeiras vítimas da história.

É curioso observar, aliás, como já nós acostumamos tanto com clichês como o do personagem que resolve manter a câmera ligada 24 horas por dia, registrando até as cenas mais prosaicas, o do outro que reage de maneira excessivamente agressiva ao escrutínio constante da câmera, o do sexo como prenúncio de tragédia e (se for extra-conjugal ainda…) ou – o mais “recente” – o da auto-consciência dos personagens, que constantemente fazem brincadeiras do tipo: “Isso está parecendo uma premissa de filme de terror”, que já reagimos com certa naturalidade diante deles, como se tivessem se tornado convenções e, assim, sido incorporados à mitologia do gênero.

Explorando com habilidade a sensação de constante falta de ar causada pelos túneis e passagens estreitas da caverna do título, Montero se beneficia de um trabalho cuidadoso de edição de som para fazer com que a respiração ofegante dos personagens e una a uma série de outros ruídos diegéticos e nos insira cada vez mais naquele ambiente insípido. Mas é no momento em que passa a se aproximar de seu terceiro ato que A Caverna se torna realmente apavorante por plantar um conflito moral que, repulsivo à primeira vista, se torna plenamente compreensível se tentarmos nos colocar no lugar daquelas pobres criaturas do lado de lá da tela – e há pelo menos duas ou três cenas de violência gráfica que certamente causarão enjoos e quedas de pressão nos mais frágeis.

Como sempre digo, para fazer um bom filme de terror o diretor não precisa necessariamente ter uma ideia brilhante. Basta saber usar as ferramentas certas e os mecanismos históricos do gênero para inserir o espectador em seu universo e fazê-lo sofrer ao lado dos personagens – e isso, A Caverna faz muito, muito bem.

poster la cueva terror espanhol

A Caverna (La Cueva, Espanha, 2014). Dirigido por Alfredo Montero. Escrito por Alfredo Montero e Javier Gullón. Com Marta Castellote, Xoel Fernández, Eva García-Vacas, Marcos Ortiz e Jorge Páez.