MINHA MÃE SEMPRE SE REFERIU AO JEFF GOLDBLUM COMO “O MOSCA”. Mesmo quando ele aparecia em outros filmes, como “Jurassic Park” ou “Independence Day”, ela sempre lembrava, arrepiada: “Credo, é aquele homem-mosca”. Sempre tive curiosidade em conferir o que a havia impressionado tanto. Por isso, para esta semana pré-Halloween no Cinema de Buteco, resolvi buscar esse clássico do horror sci-fi anos 80.
“A Mosca” é o remake de um filme de 1958. A idéia é basicamente a mesma: cientista de fundo de quintal cria máquina de teletransporte, mosca entra na máquina junto com ele, os dois se misturam. O conceito já rendeu até um episódio de Dia das Bruxas nos Simpsons, em que Bart se mescla com uma mosca e a família passa a criar um corpo de menino com cabeça de inseto, quando na verdade sua consciência está em um mosquitinho com cabeça de Bart, que mal consegue ser ouvido.
A história de “A Mosca” é contada com calma. Jeff Goldblum é Seth Brundle, o cientista que há anos vem trabalhando secretamente em seus “telepods”, aparelhos que escaneiam as moléculas de um objeto e o transportam de uma unidade a outra. A geringonça funciona perfeitamente com qualquer objeto inanimado, o que já seria suficiente para revolucionar o sistema de correios mundial e garantir a Brundle uma rechonchuda conta bancária. Mas ele não está satisfeito, e quer porque quer teletransportar seres vivos. Seus testes costumam falhar miseravelmente: um pobre babuíno chega a ser virado do avesso, com órgãos expostos e gemido agonizante, na primeira cena mais podreira do filme.
O elenco é enxuto e, além de Goldblum e do babuíno, conta apenas com Geena Davis – a jornalista especializada em assuntos científicos que acaba se envolvendo romântica e sexualmente com Goldblum, e até o acha “bonitinho” – e John Getz, chefe e ex-namorado-ciumento da garota.
A primeira metade do filme transcorre como um bom exemplar da Sessão da Tarde, sem chocar as criancinhas nem meter medo na vovó. Mesmo quando a Musca domestica entra no telepod junto com Brundle e eles se fundem em um só ser, a transformação não é instantânea: aparentemente, ele continua o mesmo. A primeira característica diferente, à la Homem-Aranha, é um aumento considerável de força muscular e habilidades corporais – dois ginastas foram contratados como dublês na cena em que ele faz piruetas em seu apartamento. Brundle também passa a falar sem parar, move a cabeça o tempo todo que nem uma mosquinha irritante, e ainda ganha um apetite voraz por doces (ainda bem que os roteiristas não levaram o conceito ao pé da letra e nos privaram de ver Jeff Goldblum comendo cocô.)
É na segunda metade que “A Mosca” foca no que lhe daria fama: a metamorfose de Brundle num insetão asqueroso. O que no início parecia acne torna-se um rosto deformado e perebento. Caem as unhas, depois os dentes e até as orelhas. Litros de fluidos asquerosos completam o pacote. A maquiagem foi tão aclamada na época que ganhou até Oscar em 1987, embora decepcione no final do filme, quando é fácil perceber que Goldblum veste uma roupa de borracha.
Menos sombrio do que eu esperava, mesclando humor, ficção científica e horror trash, uma interpretação inspirada de Jeff Goldblum e um final com uma transformação bizarríssima, “A Mosca” ainda diverte e é uma boa pedida para este Halloween. Só não assista durante o jantar.
“The Fly”, EUA, 1986
Direção de David Cronenberg