Submarine

“Hoje à noite me deparei com um texto sobre Ultra-som. Ultra-som é uma vibração de alta frequência que é inaudível. Foi desenvolvido para localizar objetos submersos: submarinos, bombas de alta profundidade, Atlantis e tal. Alguns animais como morcegos, golfinhos e cães podem ouvir na frequência ultra-sônica. Mas nenhum ser humano pode. Ninguém realmente pensa ou sabe o que  o outro realmente pensa ou sente. (…) Estamos todos viajando sob o radar, sem sermos detectados. E ninguém pode fazer nada sobre isso.”

OLIVER (CRAIG ROBERTS) TENTA PASSAR PELA VIDA ENQUANTO SE IMAGINA NUMA REALIDADE TOTALMENTE DESCONECTADA. Mal sabe ele que não é necessário nenhum esforço imaginativo para que isto aconteça. Estamos todos desconectados com a realidade e com as pessoas com as quais nos relacionamos.  Esta conexão não acontece a priori. Deve ser construída de maneira cuidadosa pois existe uma barreira inconsciente que nos protege deste contato imediato com o outro. Há aquela barreira que esconde nossas personalidades imergindo-nos num mundo do qual podemos nos libertar, não sem dificuldade; e há aquela barreira que nos protege quando expõe uma personalidade que não é a nossa: é mais forte, mais ameaçadora, intocável, e por isto mesmo falsa. Submarino, filme mágico de Richard Ayoade é surpreendente e mágico por quE conta atráves de uma história (que tem tons de fábula em alguns momentos) sobre como essas incomunicações podem ser burladas. Ou não.


Já não é caso raro no cinema atual partir de um personagem completamente desajustado para a partir dele ancorar uma história que abarque as vivências de tantos outros personagens e o que passa a interessar é justamente este prisma de personalidades que vão sendo descobertas com o desenrolar dos acontecimentos. Oliver, o garoto recluso da vez, tem uma namorada durona cuja  mãe tem uma doença terminal, e seus pais estão passando por uma fase de frieza do casamento e estão prestes a se separar. Ele tenta pensar em soluções para resolver ambos os problemas. Há ali uma necessidade de se afirmar procurando solucionar pendências que não lhe pertencem. O que Oliver irá perceber, é que se existem problemas e soluções, ambos devem ser resolvidos com naturalidade.



Por ser retratado sob um ponto de vista que o mostra como um garoto imaturo, Oliver está de certa forma refletindo as características que acometem todos os personagens centrais da trama: a mãe neurótica que insiste parecer estar no controle (Sally Hawkins, como sempre inspiradíssima); o pai frustrado que tenta não surtar com suas próprias inseguranças; a namorada que descobre o afeto na eminência da morte da mãe, e finalmente o próprio Oliver. A insistência (visual e  conceitualmente bem vinda) de filmá-lo perto da água ou do mar, e de ora ou outra inserir a imagem de um submarino, título do filme (tanto na parede do quarto, quanto na caixinha de preciosidades da mãe) o colocam como alguém imerso a tal ponto nas situações pelas quais passa, que lhe falta um olhar objetivo, menos passional, menos impulsivo. Um olhar mais maduro. E aqui chegamos a um possível tema de Submarine.


E se o filme fala deste processo contínuo de aprendizado sobre nós mesmos, o faz de maneira leve, com belas imagens (que fotografia!), uma trilha sonora sensacional (composta pelo geniozinho Alex Turner) e com uma pitada de bom humor (a cena em que a mãe descobre que Oliver não é gay é sensacional). Boas sacadas visuais (referências geniais à Persona de Bergman e a Interiores de Woody Allen) Richard Ayoade entrega um pequeno grande filme, que emociona  sem ser piegas e faz pensar sem ser chato. Recomendo.




Submarine (2010)

Diretor: Richard Ayoade

Roteiro: Richard Ayoade, Joe Dunthorne

Elenco: Craig Roberts, Sally Hawkins, Paddy Considine