RYAN GOSLING PODE ATÉ TER CARA DE NICE GUY, mas já provou, vez ou outra, que pode ser bad ass. Em Só Deus Perdoa, seu segundo filme com o diretor dinamarquês Nicolas Winding Refn, ele é confrontado justamente com essa dualidade e precisa decidir entre pender para o lado negro da força ou se redimir.
É que Julian, seu personagem, está num momento complicado. Ele pode ser um cara relativamente respeitado no submundo do crime de Bangkok, mas a garota por quem é apaixonado não lhe dá a mínima, e a própria mãe não vê nele o necessário para tomar as rédeas da vingança pela morte do irmão.
Não que ele deixe transparecer. Gosling faz uma de suas performances mais contidas, o que por vezes cria a tensão necessária, e em outras chega a irritar. Seu contraponto é a sempre ótima Kristin Scott Thomas, a mãe enlutada e sedenta por fazer justiça pela morte do filho preferido. Crystal é uma personagem ótima, até o momento em que tenta ser o que não é e cai na armadilha da explicação em excesso antes de ficar chata.
Mas Winding Refn não parece preocupado em aprofundar os personagens de seu roteiro. Fala-se pouco, mostra-se muito. E não são poupadas cenas violentas, ambientes iluminados à exatidão para mostrar cores e texturas e enquadramentos milimetricamente planejados em cada detalhe. O que poderia ser o grande trunfo do filme perde o impacto lá pelos 10 minutos de duração e se torna um atestado de seu vazio.
Não porque pouco aconteça. O ritmo do diretor é até justificável, uma calma em oposição interessante à brutalidade de todo o resto, mas o pouco que de fato acontece não parece fazer sentido ou acrescentar à trama. Isso porque igualmente rasos são os personagens, cujas motivações são pouco exploradas e suas ações – violentas ou não – parecem gratuitas. Eles são ambíguos, mas não no bom sentido – aquele que instiga a curiosidade do espectador. Quando o conseguem, o interesse só bate em mais buracos na história.
O segredo para sobreviver a Só Deus Perdoa é não esperar uma continuação de Drive, que há apenas dois anos dava a Winding Refn a credibilidade quase irrestrita com que os “novos” diretores são festejados em Hollywood. O que parecia fresco e diferente de tudo que estava sendo lançado naquele momento (e esse é o melhor elogio que pode ser feito a um filme atualmente) vem agora empacotado em uma aura de “cool” e “cult” e embrulhado para presente. No entanto, quase cada take dessa nova empreitada deixa transparecer uma pretensão que não se traduz em uma história bem amarrada – o que, no fim das contas, faz valer a experiência. A contratação de Larry Smith (que iluminou De Olhos Bem Fechados), embora uma decisão competente, atesta uma fotografia voltada para o estilo que, se por um lado é marcante, não se sustenta sozinha. Porque não são as tomadas bonitas ou as cenas chocantes que fazem filmes inesquecíveis. E Nicolas Winding Refn não é Stanley Kubrick. Ao menos, não ainda.

Direção: Nicolas Winding Refn
Roteiro: Nicolas Winding Refn
Elenco: Ryan Gosling, Kristin Scott Thomas, Vithaya Pansringarm
Lançamento: 2013
Nota:[uma ]