Amizade Colorida


O SEMISONIC FOI UMA BANDA DE SUCESSO MEDIANO NO FINAL DOS ANOS 90. O single “Closing Time” era tocado exaustivamente na MTV Brasil, embora a minha favorita fosse “Secret Smile” (que até hoje é uma das minhas canções prediletas), não existe forma de ignorar a potência do maior sucesso da banda. Os responsáveis por Amizade Colorida tiveram a sabedoria (e sensibilidade) de usar a música de forma quase leviana durante uma sequência sem importância e retomaram o gancho na cena final da comédia. O efeito, arrepiante, diga-se de passagem, faz valer todo o filme e você nem se lembra mais de que assistiu essa mesma história em Sexo Sem Compromisso


Will Gluck consegue fazer um excelente trabalho na direção da comédia romântica estrelada por Justin Timberlake e Mila Kunis. Ainda que o resultado fique abaixo de A Mentira (inclusive, a protagonista Emma Stone faz uma pequena participação especial na cena de introdução de Amizade Colorida), Gluck é capaz de capturar a essência de um casal moderno e consegue escapar do discurso machista ou politicamente correto. Mais louvável ainda é dizer que os momentos românticos não deixam o espectador embaraçado. 

Timberlake interpreta um publicitário que é contratado para uma grande empresa. Kunis é a responsável por todo o contato e trata de cuidar da mudança dele de Los Angeles para Nova York. Como não podia deixar de ser, ainda mais quando ambos acabaram de terminar seus respectivos relacionamentos, uma certa tensão sexual passa a ser evidente. 

Decididos a usar o jogo de tênis como uma metáfora para a transa casual, a dupla resolve se arriscar e viver uma amizade com benefícios. O resultado é o sonho de qualquer pessoa (seja ela homem ou mulher), pois você passa a se relacionar com alguém que, além de não ter a pressão de agradar, ainda pode dar conselhos e dizer que você não é tão bom quanto disseram por aí. 

Seguindo a linha de Sexo Sem Compromisso (que você lê a crítica aqui), o grande diferencial aqui é fugir do clichê de jogar a mulher como uma pessoa mal-resolvida. Se a personagem de Natalie Portman era o retrato da mulher moderna que fingia preferir o sucesso profissional ao romântico (algo mais comum do que se imagina), Kunis é exatamente o oposto e não finge ser o que não é, muito menos se deixa levar pelos falsos moralismos. Forte e consciente do que quer, ela não hesita em levar um relacionamento estritamente sexual com o novo amigo, mas também não foge da raia quando percebe que existe o potencial para algo maior ali. 

Já o personagem de Timberlake é bem diferente do ingênuo romântico representado por Ashton Kutcher. Consciente do seu sucesso com o público feminino e extremamente confortável ao lado de uma mulher independente, Timberlake cria uma barreira que o impede de aceitar e enxergar que está apaixonado. Embora tenha um arco dramático forte, com a excelente participação especial de Richard Jenkins (que protagoniza uma das cenas mais lindas do filme, enquanto almoça em um aeroporto), o roteiro não consegue escapar do clichê do apaixonado relutante e que precisa consertar os erros. 

Existem algumas outras semelhanças entre as duas produções, como o fato das duas atrizes ficarem semi-nuas o tempo inteiro (e eu nem sinto falta do meu colírio), mas o mais curioso é lembrar que Kunis e Portman estavam juntas em Cisne Negro. Muita coincidência ambas surgirem em dois filmes tão parecidos. Espero que não exista nenhum projeto envolvendo Timberlake e Kutcher juntos em algum thriller chamado O Ganso ou algo do tipo. 

O roteiro oferecia uma péssima oportunidade de revelar a identidade do pai da personagem de Kunis e felizmente, o bom senso prevaleceu e a trama cuidou para que o divertido personagem gay de Woody Harrelson não tivesse um passado no “lado negro” da força. Aliás, seu personagem é apresentado (ou introduzido, para ficar uma coisa mais semântica) numa clara alusão ao filme Homens Brancos Não Sabem Enterrar, de Ron Shelton, um dos maiores destaques da carreira de Harrelson. 

O grande lance de Amizade Colorida é a forma natural como a história flui e a identificação quase que imediata que os personagens causam no público. É um romance moderno e sem medo de ter um final feliz, com personagens que poderiam ser nossos próprios amigos (ou até mesmo reflexos). Para os românticos incorrigíveis e eternos apaixonados, essa é (ao lado de Sexo Sem Compromisso e o excelente Amor a Toda Prova) uma das melhores opções lançadas em 2011. 

Três caipirinhas.
E a pergunta: alguém ainda acredita que uma amizade entre homem e mulher pode ser prejudicada se houver sexo?