
(The Limits of Control) De Jim Jarmusch. Com Isaach De Bankolé, John Hurt, Tilda Swinton, Gael Garcia Bernal, Bill Murray.
“Os melhores filmes são como sonhos, nunca temos certeza se realmente os tivemos”.
Se a noção de senso de realidade está diretamente relacionada com a noção de causa e efeito, os filmes de Jim Jarmusch estão à beira do surrealismo. Em todos os seus filmes percebe-se uma gratuidade das ações, das motivações dos personagens, e em alguns momentos como neste Os Limites do Controle sua inexistência. Se no começo de sua carreira esse clima nonsense chegava a ser de certa forma exagerado (Permanent Vacation, Down By Law), agora se percebe a permanência dessa temática acompanhada de um refinamento (nunca vi Jim Jarmusch tão elegante quanto neste trabalho). Mas o niilismo de Jarmusch nunca é pessimista. Antes disso é apenas realista no sentido de que existe uma constatação tanto existencialista quanto no que diz respeito à posição do espectador enquanto tal: a falta de sentido aqui não é finalidade, mas sim meio para que o diretor expresse uma idéia. O intuito não é deixar o espectador perdido gratuitamente, mas sim alertá-lo para o fato de que não é necessário se encontrar. Filmes não têm obrigação alguma de fornecer explicações lógicas e de satisfazer um possível desejo por sentido. “Use a imaginação!”, nos diz Os Limites do Controle em determinado momento.
A história trata de um solitário homem (Isaach De Bankolé) que vai à Espanha com o propósito de cumprir ordens sem muito questionar. Sua eficiência é o que interessa, e ele está interessado em fazer seu trabalho da forma mais discreta possível. Entre encontros com intermediários com quem troca caixas de fósforos, conversas sobre assuntos banais. Embora a imagem de Isaach De Bankolé inspire certo respeito, medo e periculosidade, ele nunca usa de violência. Ele pouco fala, embora sempre seja questionado sobre seus interesses por aqueles que encontra: artes, ciência, música, sexo? Aquele homem não se interessa por nada e é como se estivesse deliberadamente perdido dentro de uma lógica que não lhe pertence.
É algo parecido com O Processo de Kafka (que virou filme pelas mãos de Orson Welles): um sujeito preso em uma burocracia que lhe impede de compreender algo mais profundamente. Aqui e com o Josef K. de Kafka o protagonista apenas vive de acordo com aquilo que lhe é demandado, age de acordo com os caminhos que as circunstâncias lhe apresentam, sem ter poder algum de interferir. Isso explica muito sobre o título: a necessidade de controle esbarra justamente na capacidade de entender o todo (controle do protagonista, controle do espectador sobre suas expectativas a respeito da história).
O filme todo é muito cool: o elenco é repleto de participações inspiradas (Tilda Swinton – musa eterna, Gael Garcia Bernal, John Hurt e Bill Murray – que já havia colaborado com Jarmusch no também sensacional Flores Partidas), clima de Onde os Fracos não Tem Vez, só que mais insípido, quase que como uma tentativa de ser algo, um truque de Jarmusch para enganar aquele que assiste. Frases recorrentes, um clima de mistério (que à medida que o filme avança descobre-se: não leva a nada), um protagonista durão que se sensibiliza com obras de arte.
Dito isso, pra quê assistir a um Jim Jarmusch? É uma pergunta difícil já que provavelmente nem ele mesmo responderia isso de forma positiva. O que interessa mais em Jarmusch não são as histórias (embora repletas de diálogos interessantes) mas esse universo particular que ele cria. Um dos representantes mais roots do cinema underground americano. Recomendo.

Tilda Swinton: uma das atrizes mais expressivas do cinemão americano. Pago pau mesmo.