Filme: Que Viva Eisenstein! – 10 Dias que Abalaram o México (Mostra de São Paulo 2015)

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Como cinebiografia do lendário cineasta soviético Sergei Eisenstein, Que Viva Eisenstein! – 10 Dias que Abalaram o México tem um grande trunfo: como o título já diz, seu roteiro se concentra num período limitadíssimo de tempo, o que permite que sua segunda vocação ganhe força e profundidade; o estudo de personagem sensível e humano do homem por trás do mito (o pouco que vemos sobre suas obras-primas O Encouraçado Potemkin, Outubro e A Greve é nas interrupções em que trechos dos filmes invadem a tela em momentos específicos). Infelizmente, a precariedade de certos efeitos visuais e a caricatura em que o protagonista quase se transforma em determinados momentos fazem do projeto um pouco menor.

Escrito e dirigido pelo experiente Peter Greenaway (O Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante, O Livro de Cabeceira), o longa se passa em uma viagem que Eisenstein (Bäck) fez ao México a convite do governo daquele país a fim de realizar um projeto em terras americanas (e que viria a se chamar Que Viva México!, hoje disponível em cópia restaurada). Aos 33 anos de idade, o diretor russo ainda era virgem – e foi em Guanajuato que ele conheceu Luis Alberti (Cañedo), um homem viril que, contratado como seu assistente, acabou se tornando seu primeiro amante. O filme mexicano de Eisenstein pode nunca ter se tornado célebre, mas sua vida pessoal foi lá transformada pela descoberta da própria sexualidade.

Fazendo questão de tentar provar que se interessa por recursos visuais – o que não quer dizer, como já havíamos visto em sua pavorosa sequência no igualmente ruim 3x3D, que entenda do assunto -, Greenaway já apresenta o título do filme em um plano em que um carro se dirige “à tela” enquanto pequenos quadros em movimento de alguns de seus filmes são usados para compor o enquadramento (e o efeito parece ter sido criado por um estudante do Ensino Fundamental mexendo no Power Point). Justiça seja feita, até há um ou outro experimento visual do cineasta que dá certo – o plano que une matte painting nas laterais e uma profundidade de campo enorme no centro é belíssimo -, mas, na maior parte do tempo, suas firulas quase amadoras mais distraem que contribuem com a narrativa.

É assustador perceber, aliás, que Greenaway e o montador Elmer Leupen não fazem a menor ideia do que era a montagem construtivista de Eisenstein e seus colegas do movimento formalista soviético, acreditando que jogar inserts de cactos no meio de um plano que se passa nos arredores de um deserto, por exemplo, tem alguma coisa a ver com os recursos de criação de sentido que predominaram nos filmes russos dos anos 20. Mais uma vez, aqui e ali a dupla até acerta, como ao usar o divertido recurso de falso raccord em que o protagonista é visto dizer a mesma frase em três planos que duram exatos 24 quadros duplicados (ou algo próximo a isso), mas mesmo esses momentos funcionam no máximo como uma piscadela divertida para os cinéfilos. (Até por que, não consigo imaginar que diversão o filme proporcionaria a alguém que jamais ouviu falar de Eisenstein.)

Protagonizado por Elmer Bäck como um lunático que assistiu a Amadeus vezes demais (e o filme não trata a suposta demência do cineasta com a menor sombra de dúvida), Que Viva Eisenstein! acaba funcionando melhor quando foca na dinâmica entre o protagonista e Alberti, transformando em um longa do subgênero coming of age apesar da idade adulta de seu personagem principal.

Que Viva Eisenstein! – 10 Dias que Abalaram o México (Eisenstein in Guanajuato, Holanda/México, 2015). Escrito e dirigido por Peter Greenaway. Com Elmer Bäck, Luis Alberti, Maya Zapata, Lisa Owen, Stelio Savante, Rasmus Slätis e Jakob Öhrman.