Filme: Peter Pan

Peter Pan

É ENGRAÇADO QUE GERALMENTE RECEBO AS PREQUELS COM MUITA DESCONFIANÇA, mas no caso de Peter Pan (Pan), de Joe Wright, não foi bem assim. Observei a produção com pouco interesse (o que atribuo à escalação de Wright na direção – não é que eu deteste o trabalho do cara, mas não sinto vontade de ver as suas obras) e deixei para mergulhar na maravilhosa Terra do Nunca sem ter nenhuma ideia do que esperar.

Peter (Levi Miller) é um jovem orfão atentado que é sequestrado por um bando de pirata com o rosto pintado de palhaços psicopatas a bordo de um navio voador em plena Londres na Segunda Guerra Mundial. O que Peter não imaginava é que estava prestes a desembarcar num mundo conhecido como a Terra do Nunca e que despertaria a ira do temível Barba Negra (Hugh Jackman), um velho pirata decidido a ser imortal e que acredita que Peter seja uma ameaça para os seus planos.

Ao contrário do que assistimos em Oz, Mágico e Poderoso, de Sam Raimi, a ideia de contar as origens de Peter Pan em uma história inédita funciona muito bem. Não que o longa-metragem estrelado por James Franco seja ruim, mas é como se faltasse algo nele. Nessa história de prequels, a nova versão da Terra do Nunca está mais próxima do divertido Malévola do que de Oz ou mesmo a loucura psicodélica de Tim Burton em Alice no País das Maravilhas (esse sim uma verdadeira bomba sem graça, mas que ainda assim serviu de referência para o roteiro de Peter Pan). Talvez seja uma coisa mais pessoal, afinal de contas, sou apaixonado com o clássico Peter Pan e me arrepiei a cada vez que reconhecia um velho personagem (o velho assistente do Capitão Gancho, o Smee, por exemplo, nem precisou ser apresentado para eu saber quem era), então posso dizer que a ousadia de mexer numa obra tão importante funcionou muito bem para mim. E se falamos de Peter Pan, não existe a menor possibilidade de não citarmos o Capitão Gancho (Garrett Redlund). Retratado aqui como uma espécie de Indiana Jones da nova geração, o jovem futuro inimigo mortal de nosso herói é introduzido para o espectador enquanto está afiando suas ferramentas com um gancho. A sutileza de Wright para apresentar o personagem é digna de elogios, assim como é a sua primeira conversa com Peter.

Peter Pan destaque

Barba Negra é apresentado ao mesmo tempo em que a obra ganha de vez a atenção e interesse do espectador com uma releitura arrepiante de “Smells Like Teen Spirit”, do Nirvana. (Clique aqui para ler sobre a trilha sonora de Peter Pan) Talvez Wright tenha pecado em não criar certo suspense para que o espectador sentisse um pouco de medo de conhecer o vilão, mas a narração de algum personagem descrevendo o vilão ao mesmo tempo em que o mesmo aparecia se preparando em cortes rápidos daquele jeitinho Michael Bay de ser atrapalhou um pouco. E a apresentação de Jackman poderia ter causado arrepios naqueles que detestaram Os Miseráveis se não fosse por três detalhes: 1) Quem fodeu Os Miseráveis foi o diretor Tom Hooper; 2) Quem canta mal pacas é o Russell Crowe (teremos pesadelos por lembrar disso); e 3) é o Wolverine cantando Nirvana e quem reclamar disso não é boa pessoa. No elenco também temos Rooney Mara, no papel da Tigrinha. Sua escalação rendeu muitas polêmicas porque orginalmente a personagem seria uma índia, mas para os propósitos da narrativa não faz a menor diferença, afinal a intenção para ser apresentar uma guerreira que pudesse ser usada como um cosplay da Princesa Leia.

Se tem uma coisa que Peter Pan acerta em cheio é na direção de arte e concepção do universo maravilhoso da Terra do Nunca. Desde Avatar não assistia a um longa-metragem em 3D (aliás, vale muito a pena ficar um pouco mais pobre pagando pelo ingresso em 3D para uma experiência mais completa) tão bonito. A recriação do ecossistema da floresta dos Ewooks (ops), dos rebeldes é incrível. A aventura extra envolvendo as ameaçadoras aves gigantescas poderia ser apenas um detalhe para agradar aos pequenos, se não fosse pelo roteiro usar essas criaturas em um momento importante.

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Ainda que o roteiro faça homenagens descaradas à diversos outros filmes (vai dizer que o terceiro ato não possui uma sequência praticamente idêntica a Star Wars: Episódio IV – Uma Nova Esperança? Aliás, como negar as semelhanças do comportamento de Gancho com Han Solo?), Peter Pan funciona como entretenimento de qualidade para todas as idades, principalmente para aqueles que são apaixonados pelo clássico da literatura escrito por J.M. Barrie. É absolutamente emocionante do começo ao fim e uma obra muito bem vinda nos tempos atuais tão desprovidos de sensibilidade e fantasia. Ironicamente, com o fracasso de Tomorrowland, foi necessário que justo um produto não tão original assim conseguisse nos conquistar. Parece que às vezes não precisamos reclamar (tanto) da tendência dos executivos em investirem apenas em franquias e remakes. Ou talvez Peter Pan seja apenas uma feliz exceção.