O senso de humor, os temas favoritos e a construção dos personagens do cineasta Noah Baumbach (A Lula e a Baleia, Frances Ha, Enquanto Somos Jovens) não costumam variar: normalmente focados em jovens adultos enfrentando o pavor do envelhecimento e as frustrações causadas pela não realização dos sonhos da adolescência, seus filmes sempre contam com uma trilha sonora indie, diálogos e gags rápidas, referências ao universo pop e uma “moral” que ensina que, apesar dos pesares, o bom da vida é viver direito o aqui e agora – e seu novo Mistress America, claro, não é diferente, divertindo por suas situações e personagens engraçadinhos, mas jamais se aprofundando em seus verdadeiros dramas.
Tracy (Kirke) é uma jovem de dezoito anos que acabou de se mudar para Nova Iorque para fazer faculdade de Literatura. Desencantada com a vida universitária e com a realidade da cidade que antes idealizava, ela conhece Brooke (Gerwig), a filha do homem que casará com sua mãe em alguns dias – e que, portanto, logo se tornará sua meia-irmã – e logo projeta nela seu sonho americano: Brooke é independente e liberada sexualmente, não para um segundo durante o dia, circula bem por todos os círculos da cidade, sabe tudo de moda, música e Cinema e… bem, muda de humor trezentas vezes no mesmo dia, sendo capaz de recebê-la com entusiasmo apenas para, cinco minutos depois, não dar a mínima atenção ao que ela tem a dizer.
Enormemente beneficiado pelo talento de sua dupla de atrizes principais e pela dinâmica doce e convincente que elas constroem entre si, o filme apresenta a carismática Lola Kirke enquanto volta a trazer Greta Gerwig, atriz-fetiche e esposa de Baumbach, em um papel que ela mesma já interpretou dezenas de vezes: a da mulher atrapalhada, sem foco e dona de uma ironia peculiar que luta para assumir as responsabilidades da vida adulta. Se funciona ao abordar as questões envolvendo a formação da identidade de Tracy por um lado, porém, o roteiro falha em tratar a bipolaridade de Brooke pelo outro, caindo na armadilha de compartilhar a idolatria de Tracy por uma mulher que obviamente precisa mais de ajuda que de aplausos.
Rápido, engraçado na maior parte do tempo e embalado por uma agradável trilha sonora eletrônica, o longa é o segundo consecutivo na filmografia de Baumbach a carecer de um conflito maior que mantenha seu fiapo e história andando – e o recurso novamente utilizado pelo diretor é inventar um probleminha qualquer que crie uma desavença entre seus personagem para causar a sensação de que há algo a ser resolvido (se em Enquanto Somos Jovens era a subtrama desnecessária envolvendo a “trapaça” do falso documentário, aqui é a suposta traição de Tracy, que estaria usando Brooke como mera fonte de espiração para seus textos – um conflitinho que gera uma cena artificial e quase embaraçosa em que todos os personagens do longa se reúnem para escrutinar a protagonista).
Particularmente, eu assistiria feliz a quantos filmes mais ou menos repetidos Noah Baumbach e Greta Gerwig ainda quiserem fazer. O que não quer dizer que, daqui a alguns anos, conseguirei discernir um do outro em minhas lembranças.
Mistress America (Idem, EUA, 2015). Dirigido por Noah Baumbach. Escrito por Noah Baumbach e Greta Gerwig. Com Greta Gerwig, Lola Kirke, Heather Lind, Cindy Cheung, Jasmine Cephas Jones, Matthew Shear, Kathryn Erbe e Michael Chernus.