O Cinema de Buteco adverte: a crítica a seguir possui spoilers e deve ser apreciada com moderação.
O CINEMA COSTUMA ENFEITAR OS RELACIONAMENTOS. Os romances apresentados na telona podem ser bonitos sim, claro, mas na maioria das vezes sofrem pelo distanciamento da realidade. Filmes em que a mocinha encontra o seu príncipe encantado e vive feliz para sempre raramente conseguem convencer, vide tantas comédias românticas lançadas anualmente. Mas quando você pega um filme como Namorados Para Sempre, Closer – Perto Demais, Um Beijo a Mais, Encontros e Desencontros, e Antes do Amanhecer a situação muda. Você consegue sentir que aquela história poderia realmente acontecer com alguém, talvez até com você mesmo. Felizmente, Entre o Amor e a Paixão é mais um desses exemplares de romances reais.
A trama do filme escrito e dirigido por Sarah Polley até lembra um pouco Um Beijo a Mais (clique para ler a crítica) mas está mais para uma espécie de “sequência” do que poderia ter acontecido na vida daqueles personagens depois de um tempo casados. Margot (Michelle Williams) é casada com Lou (Seth Rogen) e está entediada com a sua vida de casada. Eles vivem mais como amigos do que como amantes e Margot se sente insatisfeita. Entra em cena o sedutor Daniel (Luke Kirby), que desperta em Margot sensações há muito perdidas. Ela se sente desejada, encontra o que faltava no seu casamento, mas não sabe o que fazer: Será que vale abandonar a segurança do seu casamento para investir em algo sem nenhuma garantia?
É comum viver uma situação como a de Margot. Quem nunca se viu dividido entre a certeza do seu namoro com a aparição de um estranho sedutor em sua vida? Exatamente aquele tipo de pessoa que você parecia idealizar o tempo inteiro, e que em hipótese alguma iria se interessar por você. A personagem sofria por não ter a certeza de que ainda excitava o seu marido, de que eles ainda poderiam ser felizes. Faltava algo em sua vida e no momento “certo”, Daniel deixou claro que a desejava (especialmente na sequência em que ele dá uma verdadeira aula do que é o tal “sexo verbal” que não fazia o estilo de Renato Russo). O espectador vive um dilema ao tentar julgar as atitudes da personagem: podemos mesmo culpa-la por ter buscado ser feliz? Independente dessa felicidade significar a tristeza de outra pessoa, a verdade é que Margot estava cega demais para enxergar uma mudança no seu casamento e optou por viver uma aventura. Ingênua e carente, ela confundiu sexo com amor. Porém há pessoas que acertam ao mudar de vida, ao decidirem que precisam mesmo andar na beirada do abismo para poderem buscar a felicidade.
Curioso lembrar que Williams (cujo corte de cabelo lembra bastante a atriz Carey Mulligan) também interpretou uma “babaca” em Namorados Para Sempre. Pelo menos, em Entre o Amor e a Paixão sua atitude não foi completamente condenável. A atuação da atriz é um dos pontos positivos da produção, mas o surpreendente mesmo é redescobrir Rogen em um papel sério. Tudo bem, ele ainda é o Seth Rogen, repete as mesmas coisas de seus outros filmes, mas ainda assim está maduro e seguro como o bondoso Lou.
Polley acerta ao misturar doses de comédia na história: a cena que se passa dentro de uma piscina é hilária. Momentos depois, Margot, sua cunhada e uma amiga tomam banho juntas. O filme não tem restrição em mostrar a nudez das atrizes, mas tudo é justificado quando as três olham para um grupo de mulheres mais velhas que também estão se banhando. Podemos supor que o olhar de Margot significa que o tempo irá chegar bem rápido e que ela não terá novas oportunidades para se arriscar. Chegará um momento em que ela ficará presa no seu relacionamento.
O título original do longa-metragem é Take This Waltz, que por “coincidência” é o mesmo nome de uma canção do poeta Leonard Cohen. A homenagem fica completa quando a própria é utilizada em uma das sequências mais especiais do filme: uma passagem de tempo mostra a evolução do relacionamento de Daniel e Margot. Do auge de uma vida sexual agitada e moderninha até os momentos em que o calor da relação acaba e o público é convidado a se lembrar de uma das primeiras cenas que mostravam como era comum a vida de Margot com Lou.
Com essa sequência em especial, Polley deixa explícita a sua opinião sobre o tema apresentado em seu filme. Ela pode até pesar a mão em cenas como a discussão entre Margot e sua ex-cunhada no terceiro ato (e mesmo no discurso da cunhada durante a cena em que tomam banho), mas nada que atrapalhe a mensagem de que por mais atraente seja a ideia daquela aventura, no final das contas não passará daquilo.
Entre o Amor e a Paixão é uma bela maneira de nos ensinar a valorizar o que você tem e vive hoje. Claro que a diretora firma uma visão bem fria e cruel, podemos dizer que contra se arriscar, mas o destino de Margot é merecido. O interesse pelo novo sempre estará presente, para as duas partes de uma relação. O que é preciso entender é que em raras ocasiões ele não será mais que apenas uma atração física e passageira. A insatisfação, aquela voz interior que sempre pede por mais, pode nos levar para um caminho sem volta. Muito triste imaginar que podemos ser cegos ao ponto de não perceber a sorte de encontrar alguém disposto a cuidar de você. Se você nunca viveu isso, bem, eis aqui uma chance de “aprender” com os erros alheios.
Nota:[tresemeia]