Imagem: Carnaval Filmes

Crítica: Paloma (2022)

Aos transexuais são negados direitos básicos e, por isso, testemunhamos a luta diária que a comunidade trans enfrenta em diversos campos. Porém o mais triste é ter negado o simples direito de sonhar. Paloma, de Marcelo Gomes (Cinema, Aspirinas e Urubus, disponível gratuitamente no Sesc Digital até 29/11), mostra a persistência da personagem-título, que sonha em casar de noiva na igreja católica e que não se permite desistir deste sonho que, para alguns, pode parecer algo tão simples, mas que para ela tem um grande significado.

Paloma vive e trabalha como agricultora no sertão de Pernambuco. Ao lado do namorado Zé (Ridson Reis), ela cria a filha de 7 anos e enfrenta o preconceito, a traição e a injustiça, substantivos presentes em cada canto do país. A recusa do padre em realizar o seu casamento a pega desprevenida, mas o sonho é o que move a personagem.

Para entender Paloma, é necessário se permitir entender alguém que carrega, apesar de tudo, uma dose de inocência, mesmo com a realidade batendo à sua porta  diariamente e exigindo muita maturidade desde cedo. É preciso entender também que, enquanto vivemos em um país que mata transexuais simplesmente porque existem, muitos querem apenas o básico, algo que todo mundo, teoricamente, pode ter.

Paloma não é militante, não faz parte de coletivos, não tenta fazer com que engulam a sua existência à força, mas ao mesmo tempo, entende que os seus desejos não são menores ou menos importantes do que de outras pessoas e isso, por si só, já é um ato de resistência.

Quando mencionamos preconceito, não se trata apenas de quem destila ódio às minorias, mas também de pequenas atitudes que podem passar despercebidas pelo autor da ação, entretanto é marcante para quem é alvo da discriminação. Paloma detecta este preconceito também em diálogos simples, que mostram o que cada um entende como algo normal e o que lhe foge à razão. No sertão, onde a transfobia pode ser ainda mais sufocante do que em outras partes do Brasil, saber se impor e, ainda assim, ter que engolir sapos diariamente são contradições que atingem Paloma pouco a pouco.

Imagem: Carnaval Filmes

Com muita sensibilidade e pulso firme, Kika Sena interpreta Paloma e dá ao público a oportunidade de se despir de preconceitos e entender o talento que a atriz carrega. Por Paloma, ela ganhou o Troféu Redentor de Melhor Atriz, no Festival do Rio,  e se tornou a primeira artista trans a vencer o prêmio. A direção eficiente de Gomes também é um diferencial do filme e nos mostra a maturidade do trabalho do cineasta, que já tem público fiel, conquistado com Viajo Porque Preciso, Volto Porque te Amo, Era uma vez eu, Verônica e outros títulos. Paloma será lançado nos cinemas pela Pandora Filmes e já foi exibido em festivais internacionais, em cidades como Londres e Huelva. O filme fez sua première mundial no Festival de Munique, em julho de 2021, e foi exibido na 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, em outubro de 2022. Estreia nos cinemas nesta quinta-feira, dia 10 de novembro, nas cidades de São Paulo, Curitiba, Maceió, Fortaleza, Aracaju, Manaus, Rio de Janeiro, João Pessoa, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador, Recife, Rio Branco, Brasília e Niterói e está na programação do 30º Festival MixBrasil, que acontece de 9 a 20 de novembro, em São Paulo.