O Oscar já é domingo e como não foi falado nada sobre os filmes que concorrem na categoria longa de documentário, aqui no Cinema de Buteco, falarei sucintamente um pouco sobre os cinco. Se o ano passado o anti-heroí estava em alta no cinema americano, este ano a história é outra, e a categoria nos premia com 5 histórias de artistas, cineastas e soldados que fizeram a diferença pelos seus países.
Lixo Extraordinário
Apaixonante e incrivelmente humano. Essas são as expressões que descrevem corretamente Lixo Extraordinário. Não é só o filme do Vik Muniz mas de todos os catadores de lixo desse Brasil. Muito maior que gente revolucionando a arte, é a arte revolucionando vidas. O Emocionante documentário dirigido por Lucy Walker (que também fez o incrível “Countdown to Zero” esse ano) conta a história de como o Artista Vik Muniz transformou a vida de alguns catadores de lixo, do aterro sanitário de Gramacho, devolvendo a eles dignidade e perspectiva de vida. Vik fez peças reproduzindo as fotos dessas pessoas com materiais do próprio lixão onde elas trabalhavam.
Todavia o filme não é sobre arte contemporânea e museus, mas sim sobre o poder da transformação da arte no cotidiano dessas pessoas; com foco também na composição da arte, desde a ideia, a foto, até a montagem do painel com os materiais do lixão. É uma grande injustiça o filme não estar chegando como um dos favoritos ao Oscar, pois de todos é o único que propõe soluções e não apenas instiga, e sem dúvidas o mais emocionante dentre os cinco. Fora algumas partes forçadas, como o inglês entre os brasileiros, o filme é sensacional e transformador.
Restrepo
O chocante Restrepo acompanha a história de soldados norte-americanos durante um ano no Vale do Korengal, o local de guerra mais temido em todo o Afeganistão (como o próprio soldado fala, parece que todos os grupos terroristas combinam de se reunir ali). Além disso, ainda enfrentam um fator agravante, irem para um posto de frente de linha o qual chamam de Restrepo, em homenagem ao médico parceiro morto em combate. Mas o filme não é sobre estratégias de guerra, combate ao inimigo, e essa baboseira toda americana que já estamos cansados de ouvir. Restrepo nos convida a conhecer o cotidiano desses soldados.
Além do cotidiano de guerra, o companheirismo entre os soldados, as relações deles com os habitantes, tudo retratado com maestria pelo repórter cinematográfico de guerra Tim Hetherington, temos ainda a montagem de Sebastian Junger que intercala tudo isso com emocionantes entrevistas dadas pelos soldados após regressarem. Restrepo emocionou todos no Sundance e levou o prêmio do júri popular exatamente por retratar essas dificuldades do dia-a-dia desses soldados, com a língua diferente, com a morte, com pessoas que só querem defender sua cultura e seu país. Para isso os diretores abrem mão de defender um ponto de vista, para retratar onde está o humano nisso tudo. Restrepo esteve por aqui, e bem elogiado, no Festival do Rio o ano passado.
GasLand
GasLand sem dúvidas é o meu “queridinho” dentre os cinco: por trabalhar com o sistema de denuncia jornalística (que acho incrível), por ser completamente independente (um cara e sua câmera, mais nada), e claro por ter toda a linguagem química e ambiental que sem dúvidas é a minha praia. Josh Fox e sua caminhada contra o Gás Natural tomou uma proporção nos Estados Unidos que nem ele mesmo poderia prever.
Com um “pedido” de que abandonasse suas terras por 100 mil dólares e uma câmera na mão Josh foi desvendar quais eram os reais danos que a exploração de Gás Natural deixára em todos os lugares por onde estivera, e quais são os prejuízos para as pessoas que vivem nessas regiões. O filme que tem mais cara de amador dentre os cinco já abocanhou o prêmio do Juri especializado do Sundance e vem surpreendendo a todos por onde passa. A denuncia é tão forte, e a exploração e os estragos tão grandes, que parece que os americanos chamaram a responsabilidade de Josh para si e muitas conquistas já foram alcançadas.
Os efeitos colaterais da água contaminada mostrados no documentário são gritantes e vão desde dores de cabeças até lesões no cérebro e câncer. E a cara de pau das empresas ao dizer que não sabem do prejuízo causado ao ambiente é muito grande também (sendo que as pessoas colocam o isqueiro perto da água e acende um fogaréu). Enfim… Como vivo em Macaé muito perto de todas essas empresas citadas no vídeo, e próximo ao tema exploração de combustíveis fósseis, me identifiquei muito com o filme. A questão é que aqui as pessoas não reclamam por que os estragos são na vida marinha, irrelevante para muitos.
Exit Through The Gift Shop
O filme do Bansky realmente é a produção mais fraca dentre todas. Apesar da popularidade e do burburinho (principalmente nessas últimas semanas que o artista espalhou seu trabalho por toda Hollywood), Exit Through The Gift Shop não possui um engajamento social, não retrata muito bem a classe dos artistas de rua e tampouco um ocorrido em específico. O documentário, como Bansky fala logo no início, era para ser sobre ele mas acabou mostrando a vida de Mr. Brainwash desde quando ele começou em seu cotidiano com as lentes, retratando a Street Art (parte que é muito boa), até se tornar um dos artistas de arte contemporânea mais reconhecidos de Hollywood.
Apesar de todo o envolvimento com a “pop culture”, apesar de ser muito divertido, e super marginal, Exit Through The Gift Shop não passa de um amontoado de locações arriscadas retratando bem por alto o cotidiano desses artistas, os mais famosos. Apesar de fazer o máximo para conseguir uma edição e montagem legal no documentário Bansky não consegue, e quando a câmera se vira para o cineasta então aí que a coisa desanda mesmo, e a obra fica tão pretenciosa que chega a ser pedante.
Alguns especulam que tudo não passa de um piada de Bansky e que ele é o próprio Mr. Brainwash, outros apostam que ele irá aparecer na cerimônia do Oscar. Com toda essa mídia o documentário conseguiu nessa reta final chegar bem perto do favoritismo de “Inside Job”. Enfim… só sei que para um documentário ser tão próximo da nossa realidade, com um tema tão interessante e ainda assim não convencer, muita coisa está errada (eu começaria contratando um produtor).
Inside Job
Muito mais que um documentário, Inside Job é um manual de instruções de onde não investir o seu dinheiro, sendo que a maioria dos americanos não teve a oportunidade de ser alertada com essa antecedência. Inside Job ilustra passo à passo, categoricamente, como os Estados Unidos chegou na situação em que está hoje. Extremamente explicativo e com a intenção de atingir mesmo o grande público o documentário se divide em cinco partes, contando um pouco da história da economia americana, como foi feita a bolha financeira e como ela levou à crise, quem foram os estudiosos que permitiram que isso acontecesse e em que pé está a economia americana hoje.
Com uma veia extremamente irônica o documentário atinge em cheio as necessidades dos americanos apontando um por um quais foram os agentes causadores da crise, e sem dúvidas essa é a parte mais interessante. Muitos executivos negaram dar entrevista, porém os que deram, aja óleo de peroba. Conseguir negar coisas que fizeram e dizerem diretamente para a câmera que ações fraudulentas nada mais eram que parte do processo é uma coisa que requer muita coragem.
Apesar dentre todos ser o tema com o qual menos me identifiquei, o documentário de Charles Ferguson sem dúvidas é o favorito ao Oscar, não só por causa da proximidade com um tema que atinge todos os americanos, como por também ser o único dos cinco que tem cara de produção de gente grande. Além de possuir um roteiro, diferentemente dos outros, tem Matt Damon narrando, entrevista com os principais CEOs das grandes corporações americanas, e ainda conta com uma fantástica trilha sonora com direito a MGMT no final dando um big “Congratulations” a todos os responsáveis por esta grande merda.