Desejo e Reparação

Bom, pra começar, posto aqui minhas impressões sobre esse que é um espetáculo de filme, grande ganhador do Globo de Ouro deste ano, e promessa para o Oscar: Desejo e Reparação. Agora é so aguardar pelos Cohen e Tim Burton!!!

 

(ATONEMENT), de Joe Wright. Com: Keira Knightley, James McAvoy, Saoirse Ronan, Romola Garai, Vanessa Redgrave.Confesso que saí da seção de Desejo e Reparação, me sentindo um idiota. Um idiota satisfeito, mas ainda um idiota. O novo trabalho do celebrado e promissor diretor de Orgulho e Preconceito, Joe Wright que prometia ser um filme de época feito para o Oscar, também se mostra um eficiente drama de guerra, e finalmente um exercício brilhante de metalinguagem, onde a legitimidade da narrativa cinematográfica é colocada em cheque, assim como a posição de espectador que ocupamos.
A história, a princípio, não é das mais inovadoras: Briony (Saoirse Ronan), uma garota de 13 anos e de imaginação fértil, acredita ter presenciado um crime, e acusa Robbie (James McAvoy), o filho do caseiro da mansão onde vive, e amante de sua irmã mais velha Cecília (Keyra Knigthley), de tê-lo cometido.
É este crime e a forma como Briony, chega à conclusão de que Robbie é o criminoso, que vai delinear a primeira parte da trama. Logo no início da projeção, somos advertidos de que são os olhos de Briony e sua interpretação dos fatos que vão conduzir a história; tudo será “escrito” por ela (e a trilha sonora é brilhante ao misturar o som de orquestra com o de uma máquina de escrever, sempre que a história se desenrola). Joe Wright faz uma opção muito acertada ao mostrar as duas perspectivas dos fatos, (há claramente o fato que a garota vê, e outro, distinto, que realmente aconteceu) e a forma como eles interferem no julgamento de Briony, fazendo com que o espectador saiba (ou pense que sabe) o que de fato acontece.
O segundo momento da trama se concentra nas conseqüências que o ato impensado da garota tiveram da vida daqueles três envolvidos, cinco anos depois. E é aqui que o drama de guerra toma forma, e onde Joe Wright, lança mão de recursos cinematográficos de uma maneira, no mínimo, eficiente. O plano onde os aviões são refletidos na água, e o muito bem coreografado plano sequência mostrando a praia de Dunkirk, por exemplo, são sinais de que estamos frente ao trabalho de um diretor preciosista, que não hesita em optar por alternativas menos óbvias, para manter o espectador imerso, nesta que seria uma narrativa tipicamente clássica (algo já visto em seu primeiro trabalho). Seria…
Entretanto há uma quebra desta narrativa no terceiro ato. Somos apresentados a uma Briony já bem mais velha – cabe aqui falar sobre o talento do elenco, e, sobretudo sobre a participação de Vanessa Redgrave: breve, mas muito significativa, de uma expressividade comovente, muito bem explorada pelo diretor, que decide focar toda a cena em seu olhar, de uma sinceridade impiedosa para com o espectador, e ao mesmo tempo arrependimento e culpa – onde o sentido da história de Desejo e Reparação é desvendado.
Apesar de uma obra muito bem concebida, de um apuro visual louvável, trata-se de uma crítica de si mesma, do papel e da utilidade da narrativa cinematográfica clássica: as histórias que mais nos atraem são só as que na verdade queremos ver?
Sim, fomos enganados, por Joe Right, já que todos estavam devidamente satisfeitos com o final que havia sido dado ao casal até então. Mas, qual dos desfechos nos é preferível? Até que ponto o happy ending é realmente satisfatório? E não deixa de ser interessante conferir o final “alternativo” mesmo depois da verdade revelada: não há mais a sensação de resignação, de reparação. Afinal de contas, a vida não é mesmo assim! Apenas gostamos de vê-la mais bem contada…