Crítica: O Livro dos Prazeres (2020)

Quarenta e cinco anos após a sua morte, a obra da escritora Clarice Lispector ainda causa impacto e se mostra relevante no Brasil de 2022. O Livro dos Prazeres, coprodução entre Brasil e Argentina, chega aos cinemas brasileiros mostrando toda a complexidade e feminilidade de Lispector, além de revelar o trabalho de Marcela Lordy na direção do seu primeiro longa-metragem.

Na livre adaptação de Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres, publicado em 1969, Simone Spoladore (Lavoura Arcaica) dá vida a Lóri, uma professora do ensino fundamental cheia de angústias que preza pela sua liberdade. Passando por encontros casuais sem dar chance a envolvimentos afetivos, ela encontra Ulisses (Javier Drolas, de Medianeras), um professor de filosofia que pode mexer com ela de maneira perturbadora.

Enquanto tenta lidar com isso e entender seus sentimentos, a professora precisa passar por situações que não esperava ter que enfrentar, como algumas pendências familiares e alguns momentos que vão mostrar a ela algumas dificuldades da maternidade. 

A trajetória de Lóri expõe temas pertinentes na época da publicação do livro e ainda hoje, mais de 50 anos depois. Mais do que isso, trata o feminino com respeito e lhe dá o direito de questionar tudo o que for pertinente. A inquietude de Lóri, a sua rotina sufocante, sede de liberdade e até uma dose de melancolia são despidas, assim como o corpo da personagem. Poucas narrativas tratam o corpo feminino com tanto respeito em cenas de sexo. Marcela Lordy mostra pulso firme e muita sensibilidade para trazer essas passagens para a tela.

O longa-metragem permite que o espectador mergulhe na confusão de sentimentos de Lóri e o transporta para uma realidade que mistura as dificuldades e as delícias de ser uma mulher com sede de liberdade nos anos 1960 e em 2022. Há diferenças, mas também há muitas semelhanças.

Simone Spoladore conduz o filme de maneira espetacular e carrega no olhar toda a complexidade das emoções de Lóri. Mais uma vez se mostra uma das atrizes mais competentes e talentosas do cinema brasileiro atual. A química em cena com Javier Drolas é um dos trunfos do filme e permite que os encontros entre os personagens causem reações diferentes, conforme o caminhar da história.

O Livro dos Prazeres sua estreia na Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, em 2020, ano em que o evento aconteceu exclusivamente online, e ficou no top 3 dos mais vistos e bem votados da edição. Depois disso, o longa viajou o mundo em mais de 15 festivais presenciais e virtuais, recebendo diversos prêmios, como no 22˚ BAFICI (Competição Americana – Prêmio de Melhor Atriz para Simone Spoladore e Menção Honrosa para o longa); 26 ̊ Festival de Cinema de Vitória (Prêmio de Melhor Roteiro, Melhor Interpretação para Simone Spoladore e Menção Honrosa para Fotografia de Mauro Pinheiro Júnior, ABC); e Festival do Rio 2021. Ele também foi distribuído pela sales alemã M_appeal para o Japão, EUA, Israel, Taiwan e China. O Livro dos Prazeres, distribuído pela Vitrine Filmes, estreia nos cinemas nesta quinta-feira, dia 22 de setembro, nas cidades de Aracaju, Belém, Belo Horizonte, Brasília, Camboriú, Campinas, Curitiba, Florianópolis, Maceió, Manaus, Niterói, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo e Vitória.