Garoto dos Céus, de Tarik Saleh, está entre os 15 filmes que compõem a shortlist do Oscar e aguarda a indicação ao prêmio de Melhor Filme Internacional. O longa, apesar de se passar no Egito, ser falado em árabe e ter o Islã como fator importante na história, representa a Suécia na premiação. Com uma trama carregada de suspense, drama, política e religião, intriga o espectador e o conduz ao longo de 126 minutos que se passam em um piscar de olhos.
Logo nos primeiros minutos, somos apresentados a Adam (Tawfeek Barhom), um jovem filho de pescador que tem a oportunidade de fugir do destino de herdar a profissão do pai e também da criação violenta ao lado de dois irmãos. Ele ganha uma bolsa de estudos na Universidade Al-Azhar do Cairo, o epicentro do poder do islamismo sunita. O que parecia a realização de um sonho e oportunidade de ascensão social se transforma em pesadelo quando Adam, recém-chegado à universidade, se torna peça fundamental de um quebra-cabeças que estava sendo montado com o intuito de definir uma importante figura religiosa, porém tudo estava ligado à política. A figura do fanatismo religioso aparece no filme, revelando uma teia complexa formada por muita hipocrisia e incoerência.
Com a dose certa de tensão, o filme se desdobra e permite que o espectador mergulhe na sensação de que algo ruim pode acontecer a qualquer momento, enquanto Adam se dá conta de que ser aceito na universidade foi apenas o primeiro passo de um longo caminho que ele terá que percorrer, se quiser construir a sua própria história.
Diante de situações que o transformam em um informante de um agente a serviço do governo egípcio, Adam precisa entender que a sua vida não lhe pertence mais, o que o deixa à mercê de potenciais inimigos de todos os lados. Ao mesmo tempo, o jovem é obrigado a perder a ingenuidade que carregava como uma de suas principais características.
Por mais que a história de Saleh não seja original, a ambientação e o contexto possuem relevância e trazem características próprias ao enredo. Não à toa, o filme conquistou o prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Cannes 2022. A direção do cineasta sueco de ascendência egípcia é firme e é perceptível a mão de quem conhece os costumes da sociedade retratada no filme. No papel de Adam, Tawfeek Barhom se mostra um ator competente e capaz de transmitir o turbilhão de emoções que o personagem carrega, incluindo empolgação, surpresa, medo e desconfiança.
A temporada de premiações gera comoção entre os cinéfilos e a maioria corre para ver os possíveis indicados em várias categorias. No meio de tantos fatores a serem considerados, os prêmios que mais me chamam atenção são aqueles que apontam o Melhor Filme em Língua Estrangeira ou Melhor Filme Internacional.
Destacando o Oscar e o Globo de Ouro, há diversos títulos que fizeram sucesso, foram reconhecidos na categoria e são lembrados ainda hoje, como é o caso de A História Oficial (Luis Puenzo, 1985) e O Segredo dos Seus Olhos (Juan José Campanella, 2009), ambos representantes da Argentina. Há também aqueles que não receberam os principais prêmios, mas são lembrados mais de uma década depois, enquanto os premiados caíram no esquecimento. É o caso do dinamarquês Em um Mundo Melhor (Susanne Bier, 2010), que levou o Oscar e o Globo de Ouro, entre outros prêmios, e hoje é pouco lembrado, enquanto o canadense Incêndios (Denis Villeneuve, 2010) catapultou o nome do diretor para o grande público e o levou para o cinema norte-americano. A shortlist do Oscar 2023 deixou de fora o representante brasileiro Marte Um (Gabriel Martins) e até o anúncio dos indicados, no próximo dia 24, quinze países estão na expectativa. Alguns títulos já são quase certos que conseguirão a indicação. Dificilmente Argentina, 1985 (Santiago Mitre), ganhador do Globo de Ouro na categoria, vai ficar de fora. O alemão Nada de Novo no Front (Edward Berger) e o mexicano Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades (Alejandro González Iñarritu) também têm grandes chances de indicação. Mas sempre há alguma surpresa, algum filme que poucos consideravam ou que não recebem muita atenção. Garoto dos Céus pertence ao grupo dos filmes que nem todos acreditam que ficarão entre os finalistas, mas que seria uma surpresa agradável.
Garoto dos Céus foi exibido na 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2022, e estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, dia 19 de janeiro, nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Salvador, Brasília e Belo Horizonte.