NO MUNDO EM QUE VIVEMOS HOJE onde toda a informação é bombardeada e repetida à exaustão, fica difícil nos isolarmos e não querermos saber sobre certas coisas, especialmente sobre filmes e séries, cujos comentários são amplamente alardeados por muitas pessoas em redes sociais como o Twitter, o Facebook e o Instagram. Garota Exemplar é um desses filmes, que devemos ir assistir cheios de expectativa e com poucas informações, mas que será complicado para o espectador não receber, com sua anuência ou não, uma série de spoilers, já que a obra toca em alguns pontos muito sensíveis. O que não faltarão serão comentários a respeito. Por isso, evite, na medida do possível, ler ou ver coisas a respeito do filme. Mas também exerça a tolerância. Será difícil não ser bombardeado.
Parece contraditório escrever sobre algo que acabei de dizer que não se deve ler sobre, mas esta análise que faço aqui será superficial, sem me aprofundar em enredo ou roteiro. Espero que ela ajude a aqueles que quiserem assistir ao filme prestando atenção em alguns aspectos técnicos.
David Fincher nos conduz ao longo de toda a obra com maestria. O diretor de Seven, Zodíaco, O Curioso Caso de Benjamin Button e A Rede Social mostra, com este filme, seu talento em ser um par de mãos invisíveis por detrás de tudo o que vemos. Ele está presente nos detalhes, não sendo muito evidente, mas também não passando despercebido. Seu toque de Midas está lá e é graças à sua condução que duas horas e meia passam voando. Chega a ser assustador olhar pro relógio e perceber que sequer respiramos direito durante todo o filme. O ritmo é dinâmico
O enredo é adaptado de um livro escrito por Gillian Flynn, que também é a roteirista, o que só agrega à obra. O envolvimento de um escritor no roteiro normalmente traz resultados muito bons, já que aquela pessoa que visualizou a história no papel consegue “fazer a costura” nos lugares certos para que essa visão seja transmitida com a maior fidelidade possível para a tela. Não seria surpresa uma indicação a melhor roteiro adaptado no ano que vem.
Há uma crítica evidente e profunda à mídia, especificamente o jornalismo sensacionalista e a forma como ele seleciona aquilo que lhe interessa para entregar aos “consumidores”. Fincher também coloca o “dedo na ferida” no que diz respeito ao processo de hiper inclusão da tecnologia no nosso cotidiano, incluindo redes sociais e as famigeradas selfies.
Ben Affleck e Rosamund Pike não apenas dão credibilidade aos personagens, como também conseguem, de maneira bastante inteligente, nos levar a acreditar na verdade de cada um deles. Tomamos partido, fazemos nossas escolhas, nos envolvemos. Será surpreendente se nenhum dos dois emplacar indicações ao Oscar no ano que vem.
E Trent Reznor e Atticus Ross repetem a parceria de sucesso com David Fincher, que lhes rendeu um Oscar em 2011, numa trilha sonora que não se sobressai ao filme, mas consegue dar voz aos muitos dramas interiores vividos pelos personagens.
Não é exagero dizer que Garota Exemplar é um filme indispensável para qualquer interessado na sétima arte. A forma como a história é contada, se estabelece e se divide é coisa rara e tem tudo para fazer alguns cineastas coçarem a cabeça e se esforçarem um pouco mais no futuro.