Crítica de Malcolm & Marie: uma DR longa e sincera

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Crítica de Malcolm & Marie: uma DR longa e sincera

Relacionamentos amorosos são complicados. Aliás, sempre foram e sempre serão. Não é fácil conviver com uma pessoa – ou várias, vai saber -, ainda mais se não existe sinceridade entre as partes envolvidas. E quanto maior forem as mágoas não resolvidas e não faladas, mais problemas se acumulam, até a hora em que transbordam. Malcolm & Marie (EUA, 2021) nos mostra, em tempo real, o que acontece quando uma atitude resulta numa longa e cansativa discussão de relação. Ou como gostamos de dizer: DR.

Enredo

Malcolm (John David Washington) é um cineasta promissor, que acaba de chegar em casa com Marie (Zendaya), sua namorada de longa data. Ele está extremamente feliz por causa da recepção de seu novo filme, mas ela não parece tão feliz assim. Aparentemente, o motivo disso foi a falta de menção do nome dela nos agradecimentos dele após a exibição da película. A partir daí, são cerca de duas horas de brigas, beijos, carícias e risos.

Relacionamentos são difíceis

Gravado entre junho e julho de 2020, durante a pandemia da COVID-19, o filme é, basicamente, uma leitura densa de um relacionamento que anda aos trancos e barrancos. Existe amor ali, mas quem já viveu uns bons anos sabe muito bem que amor não é suficiente para salvar uma relação, ou para mantê-la feliz. Estar com alguém vai além de dizer “eu te amo”. E olha que existem pessoas que ficam juntas até sem amor correspondido! Mas isso é papo pra outra ocasião.

Sam Levinson, diretor e roteirista do filme, explora variados aspectos das personalidades dos protagonistas, que, aos poucos, revelam informações sobre seu passado e o próprio histórico do casal. O cineasta deixa bastante explícito o quão difícil é se envolver com outra pessoa; como que, num mesmo dia, é possível ter altos e baixos, com momentos de alegria e paixão, encadeados com outros de ódio e violência. Em algumas cenas, rimos com as posições de Malcolm em relação aos críticos de cinema e as reações de Marie. Em outras, assustamos com a sua capacidade de diminuir a namorada de forma tão cruel. Marie também tem seus momentos de destaque, em que mostra suas dores, carência, inteligência e humor.

Ambiente tenso

Quase tudo que vemos acontece dentro de uma casa, isolada da civilização. O lugar é bem espaçoso, moderno, com janelas de vidro por toda parte, e uma grande área natural em volta. Parece o lugar perfeito para um casal apaixonado, mas se torna palco da famosa lavação de roupa suja. O fato de ter sido gravado em preto e branco ajuda-nos a envolver com a história e naquele ambiente tenso. Pra ser sincera, chega uma hora em que você nem se lembra disso porque está imerso (a) nas discussões viscerais do casal.

No último ano, vimos notícias sobre o aumento de divórcios no Brasil e ao redor do mundo. No entanto, não foi a pandemia que causou tais rupturas. Na verdade, ela somente as acelerou. Como diz minha terapeuta, casais mal resolvidos, que deixam acumular problemas e coisas não ditas, viram na pandemia uma a gota d’água para o fim. Às vezes, a relação até já estava morta, mas os indivíduos gostam de empurrá-la com a barriga por questões de carência, comodidade e/ou aparência. Cada um com seus problemas, que precisam ser tratados para poderem evoluir e ter um relacionamento saudável no futuro.

Veredito

Lembrei-me de Antes da Meia-Noite (2013), pois minha reação diante das discussões entre Malcolm e Marie foi bem similar às de Jesse e Celine. Se nos dois primeiros filmes vimos um casal romântico e apaixonado, no fim da trilogia eles ainda se amam, mas estão numa relação completamente desgastada. Brochei e fiquei com raiva do Richard Linklater por um tempo, admito. Depois, entendi que ele só foi realista. Jesse e Celine são seres humanos, e seres humanos erram. Eles mentem, fingem, provocam e traem. Que atire a primeira pedra quem nunca cometeu um erro num relacionamento!

É cansativo? Sim, Malcolm & Marie é um filme difícil. Mas justamente por isso – e as atuações e química de Washington e Zendaya – que merece a nossa admiração. Levinson comanda uma produção capaz de traduzir, na tela, a complexidade de um relacionamento. Quer dizer, a complexidade do ser humano. Dói ver a realidade escancarada, mas é a verdade. Brigar é chato, mas casais brigam. Deal with it.

 

Crítica de Malcolm & Marie: uma DR longa e sincera