Histórias que se passam durante um dos piores momentos da humanidade, a Segunda Guerra Mundial, normalmente, expõem o pior do ser humano e, às vezes, a profunda capacidade que as pessoas têm de amar. Acontece que, enquanto o mundo gira, cada um de nós vive o seu próprio momento. Todos os dias há gente morrendo, nascendo, vivendo, descobrindo a si mesmo e o mundo um pouquinho a cada dia e se adaptando. Irène (Rebecca Marder), a protagonista de A Garota Radiante (Une jeune fille qui va bien), é uma garota de 19 anos fazendo coisas pertinentes a jovens de sua idade, como se apaixonar e ter a sorte de ser correspondida, descobrir paixões que vão muito além do significado romântico da palavra (no caso de Irène, o teatro) e desfrutar dos prazeres e da animação das amizades dessa fase da vida.
Só que Irène é de família judia, na França, durante o ocupação nazista, em 1942, e isso muda tudo. Enquanto uma guerra está acontecendo e gente está morrendo, tudo o que Irène quer e merece é ter a chance de viver a vida.
O primeiro longa-metragem dirigido pela atriz judia Sandrine Kiberlain (Mademoiselle Chambon) não cai na armadilha de mostrar cenas apelativas e de grande impacto para ilustrar as consequências do regime fascista de Hitler. A maior arma do filme é o uso da sensibilidade, da pureza e de um certo toque de ingenuidade para contextualizar o espectador. Porque, enquanto diversas histórias mostram a tensão que cidades tomadas pelo nazismo suportaram, A Garota Radiante mostra as pequenas (que, na verdade, são grandes) coisas da vida que devem ser valorizadas. Também não abraça a bandeira da militância com protagonistas revolucionários providenciando manifestações.
E é aí que a arma da sensibilidade do filme é ainda mais eficiente, porque mostra que os horrores de um governo fascista atingem, até mesmo, aqueles que não se propõem a fazer diferença no mundo, mas querem ter o seu próprio universo preservado e imaculado. Além de impedir a realização de sonhos, destrói momentos únicos e impossíveis de se recuperar.
A não-aceitação da realidade e da iminente catástrofe é o modo de resistência de Irène. Ela se recusa a permitir que as restrições, cada vez maiores, atrapalhem seus sonhos e o momento que está vivendo.
Ao público desprovido de empatia, A Garota Radiante pode parecer “mais um filme sobre a Segunda Guerra Mundial”, mas é necessário ter em mente que o esquecimento pode trazer consequências absurdas e, mais do que isso, é necessário lutar contra o fascismo todos os dias. Sandrine Kiberlain encontrou a sua maneira de fazer parte da resistência que não deve permitir o avanço do neo-nazismo. Só minimiza o seu feito quem se dá ao luxo de se alienar no século XXI.
No Brasil, o longa chega aos cinemas nesta quinta-feira, 30 de março, pela Pandora Filmes, e será exibido em São Paulo, Rio de Janeiro, Aracaju, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Niterói, Porto Alegre, Salvador e Santos.