Encantado. Foi assim que me senti logo na primeira vez que assisti a esse filme. O filme é, na verdade, um documentário, que mostra a vida de três irmãs cegas. Nascidas na Paraíba, as três já eram conhecidas na cidade mas ganharam notoriedade nacional quando foram entrevistadas por Regina Casé no extinto programa “Programa Legal”, em 1991 e, desde então, ficaram conhecidas como “As Ceguinhas de Campina Grande”.
A história contada pelo diretor Roberto Berliner começa em
Elas não têm pais e nenhum outro parente próximo e a vida é marcada por histórias tão trágicas que chegam a parecer ficção. Na época do documentário, as três se sustentavam com as aposentadorias, pouco mais de R$400, e com esmolas que recebiam pelas ruas da cidade cantando e tocando ganzá.
Elas começaram a pedir esmolas, tocar e cantar, aos sete anos, para contribuir com a renda da família. O padrasto, “autorizado” pela mãe, não trabalhava e ficava com todo o dinheiro que elas conseguiam nas ruas. Uma das três chegou a sofrer abuso sexual e engravidar do padrasto. Desde então, as irmãs decidiram sair da casa da mãe.
A produção do documentário é bem repercutida na Paraíba e em todo o país e “As Ceguinhas de Campina Grande” passam a ser consideradas – por elas mesmas, principalmente – estrelas do cinema.
O filme começa onde termina o documentário. Roberto Berliner e sua equipe voltam a Campina Grande para ver como estava, agora, a vida das irmãs dois anos depois da produção do documentário, em 2000.
Elas ganharam alguma fama, e chegaram a participar do PERCPAM – Festival Universal de Percussionistas – como convidadas para os shows de Gilberto Gil em Salvador e São Paulo.
O próximo encontro entre a equipe de filmagem e as três irmãs é em 2002. O documentário foi premiado e (nada mais justo!) elas ganharam uma parte do dinheiro do prêmio. Dinheiro esse que, somado ao cachê dos shows, foi o suficiente para comprarem uma casa em um lugar de melhor acesso para as três. Um ano depois, em uma nova série de filmagens, o diretor as encontra novamente nas ruas pedindo esmolas. Em 2004 elas receberam as medalhas da Ordem e do Mérito Cultural, e cantaram o Hino Nacional em uma cerimônia com o presidente Lula e Gilberto Gil, então Ministro da Cultura.
A graça das três irmãs é o que mais atrai. É impossível não achar graça no jeito como elas contam suas histórias. Ao mesmo, também é impossível não se sensibilizar com a vida que as três levam.
A trilha sonora do filme fica por conta de Hermeto Pascoal e João Barone – d’Os Paralamas do Sucesso. Na época do filme, foi lançado um CD duplo. O primeiro traz as irmãs cantando e tocando os ganzás nas músicas que – na sua maioria – são composições próprias. O segundo CD é uma homenagem com releituras feitas por artistas consagrados da música brasileira: Lenine, Pedro Luís e A Parede, Elba Ramalho, Pato Fu, Os Paralamas do Sucesso, Teresa Cristina, Otto e vários outros.
Se o filme vale a pena, o CD não fica atrás. (Dá pra ouvir algumas faixas aqui!)
É difícil encontrar o filme “internet afora”, mas recomendo àqueles que tiverem a oportunidade, que assistam.
Ficha técnica:
Título Original: A pessoa é para o que nasce (2003)
Gênero: Documentário
Direção: Roberto Berliner
Co-Direção: Leonardo Domingues
Roteiro: Maurício Lissovsky
Música: Hermeto Pascoal
Fotografia: Jacques Cheuiche
Edição: Paulo Ricardo Nunes