Crítica: 50 Tons Mais Escuros (2017)

50 Tons Mais EscurosA PRIMEIRA COISA QUE GOSTARIA DE ESCREVER é que eu não sou hater da franquia 50 Tons de Cinza. Reconheço as deficiências da obra literária, a qual li na ocasião do lançamento do primeiro filme, e nunca me incomodei com as limitações técnicas e intelectuais da adaptação para o cinema. Na verdade, eu me diverti horrores com o humor involuntário presente em 50 Tons de Cinza. Por isso fiquei indignado quando vários amigos colocaram o filme em suas listas de piores do ano, injustiça essa que certamente se repetirá com a sequência 50 Tons Mais Escuros (50 Shades Darker, 2017).

Anastasia Steele (Dakota Johnson) segue com a sua vida profissional longe do grande amor de sua vida Christian Grey (Jamie Dorman). Só que o lance sobre relacionamentos é que eles são complicados e a vida prega peças na gente o tempo inteiro. Justamente quando ela achava que havia se livrado do maluco das paradas loucas de couro, o sujeito reaparece em sua vida para retomarem o namoro e o conto de fadas mais safado de Hollywood.

O cineasta James Foley conseguiu oferecer uma adaptação superior. Não sei se pela liberdade de não precisar se preocupar com apresentações ou por acatar as interferências da autora do livro sem discutir, mas é até uma grande surpresa comparar as duas obras. No entanto, Foley peca na falta de conexão entre as cenas. A impressão que fica é que 50 Tons Mais Escuros é apenas um pornô chique, cujos protagonistas não necessitem de qualquer desenvolvimento, já que o importante mesmo é ver o casal trepando.

É problemático notar que apenas Anastasia parece receber atenção. Mesmo para quem apontar que a narrativa é baseada em sua perspectiva pessoal, não é assim que funciona no cinema. O público precisa de personagens tridimensionais e que nos façam acreditar que eles possam ser reais. Precisamos acreditar nos seus problemas e motivações. Grey parece um maníaco completo que vive apenas para stalkear Anastasia, enquanto os coadjuvantes estão lá apenas como figurantes.

Os diálogos da continuação reservaram poucas pérolas. Fora a parte em que determinado personagem diz que Anastasia curte um “alpinismo sexual”, não percebi nada marcante realmente. Aliás, não li todos os livros, mas posso fazer uma aposta que o “vilão” Jack Hyde (Eric Johnson) possui alguma relação com Elena Lincoln (Kim Basinger) e buscará vingança contra o terror do quarto vermelho.

O humor também foi deixado de lado em relação ao sexo irresponsável e safado. A melhor piada envolve o uso de um acessório interno com efeitos inesperados durante uma grande festa. Difícil quando tentam transformar em humor as cenas em que Anastasia observa Grey se exercitando. Ainda tenho problemas com a escalação de Dorman. Não por ele ser um ator ruim. Pelo contrário, basta ver Jadotville para conferir que o cara manda bem. Mas existem vários outros atores que realmente interpretariam um Christian Grey mais convincente e que conseguiria tornar o personagem atraente não apenas para as mulheres. Um ator melhor seria Alexander Skarsgård, por exemplo…

As cenas de sexo me deixaram intrigado. Eu até entendo quem sinta tanto tesão que faz as coisas de roupa mesmo (quem nunca?), mas não fez o menor sentido ver o Christian Grey transando vestido praticamente todas as vezes. Uma vez ou outra até passaria, só que 50 Tons Mais Escuros abusa. É incoerente uma obra que fala de um romance tão sexual tratar as fodas com tanta vergonha. Se você vai falar de sexo, é meio que obrigatório trabalhar com nudez. Porém, se pensarmos no público alvo e no interesse dos estúdios em atingir o máximo de jovens, é compreensível esse cuidado visual. Só que prejudica o andamento da narrativa.

(Ou talvez eu que seja pervertido demais e goste de ver sexo explícito em qualquer oportunidade.)

50 Tons Mais Escuros é uma divertida história de amor produzida especialmente para um público feminino ainda iludido com conceitos românticos (e com uma curiosidade biscoito de polvilho com sexo bem-feito) e que possui a certeza de que nunca conseguirá encontrar um par capaz de querer dividir um pouco de estabilidade financeira, beleza e orgasmos múltiplos todas as noites. Pelo menos no cinema, todo mundo pode sonhar livremente com suas respectivas fantasias.