O surrealismo audiovisual de Björk

por Eric Samuel

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A CANTORA BJÖRK JÁ DEIXOU UMA MARCA indelével na música e na cultura pop moderna com seus discos e vídeos, de forma apaixonante e explosiva, ela introduziu massivamente a sonoridade do ártico à música popular mundial. Os seus videoclipes nos levam a refletir sobre o papel dessa peça audiovisual na contemporaneidade – mesmo que tenha sofrido um pouco com a velocidade das transformações midiáticas –, e na formatação de sua carreira com o uso da imagem. Através de diversos meios, seja no cinema, na internet, ou mesmo na televisão, ela conseguiu diversificar, ou até mesmo minimizar os efeitos de um formato que parecia saturado.

Basta voltarmos o nosso olhar para os seus últimos trabalhos, como o videoclipe de “Mutual Core”, dirigido por Andrew Thomas Huang – artista escolhido a dedo pela cantora, e produzido em parceria com o Museu de Arte Contemporânea de Los Angeles –, que possui um apelo visual que extrapola e amplia o significado metafórico da música. A música em questão faz parte de Biophilia, o primeiro álbum aplicativo da história, que através do toque permite uma imersão audiovisual do usuário no universo criativo da artista. Uma ideia que surgiu da vontade da cantora em abrir uma escola de música para crianças.

No entanto, Björk é uma das responsáveis por elevar o audiovisual a um novo patamar artístico de qualidade, é expressamente notável a sua importância para o universo do videoclipe no início dos anos 90. Meio ao auge do gênero televisivo, ela nos brindou com imagens e sons que remetem ao que lhe traz mais inspiração: a natureza e a ciência. Sempre acompanhada de parceiros que se destacam no meio audiovisual e das artes plásticas. Ela provou que é possível absorver diversas referências artísticas, se renovar e inovar na música pop sem nenhuma fronteira e distinção de elementos.

A cantora escandinava que completa 48 anos nesta quarta-feira (21), nasceu na Islândia, uma ilha de formação vulcânica que abriga belezas naturais onde gelo e fogo convivem em perfeita harmonia. Dentre os seus poucos mais de 300 mil habitantes, uma em cada dez pessoas publicará um livro – o país é o lugar onde se tem mais escritores, livros publicados e lidos per capita do que qualquer outro lugar do mundo –, e provavelmente os outros nove estão envolvidos com a arte ou a música. A riqueza de detalhes, a extravagância visual e toda a inspiração de Björk fazem parte desse universo cultural rico em que a Islândia está inserida, meio às historias e lendas de deuses, vikings e elfos.

É impossível falar de Björk e videoclipe sem mencionar o nome diretor francês Michel Gondry, ele merece destaque especial na carreira da cantora islandesa. Gondry foi o responsável por reproduzir e traduzir o universo intimista e peculiar da artista aos nossos olhos, com muito surrealismo. A construção deste mundo fantástico, com traços surrealistas, parece ser uma constante preocupação da cantora, para conectar as suas canções ao universo audiovisual de maneira criativa e experimental. Isso faz com que ela naturalmente esteja vincula a grupos de colaboradores diferenciados da fotografia, das artes plásticas e do cinema experimental, como Spike Jonze, Chris Cunningham e Jean-Baptiste Mondino. O videoclipe de “Army of Me”, por exemplo, é um dos mais surrealistas feitos em toda a carreira de Gondry. O sampler das batidas de “When The Levee Breaks” do Led Zeppelin parecem ter servido de inspiração para as viagens psicodélicas do vídeo.

Saindo um pouco do comum e do eixo Michel Gondry/Spike Jonze, selecionei alguns videoclipes da cantora que expressam e ilustram um pouco da sua versatilidade com os meios audiovisuais, o hibridismo apresentado em seus trabalhos e o seu envolvimento com diversas formas de arte desde que se lançou em carreira solo, no ano de 1993.

“Earth Intruders” (2007)

No vídeo, Björk optou por criar uma estética que remete a tribos e a flora africana, neste que é o primeiro single do álbum Volta de 2007. Aliás, a África está presente em toda a concepção do álbum, desde a criação dos vídeos, como também nos cenários e nos figurinos da turnê. Para a direção do vídeo a cantora convidou o veterano cineasta Michel Ocelot (Contos da Noite 3D), o animador francês abusa da sua habitual técnica de desenho, com o uso de silhuetas e recortes.

“Where Is The Line” (2004)

No álbum Medúlla (2004), Björk remete ao primitivo e deixou de lado qualquer elemento que sugerisse algo moderno ou inovador. Utilizando inúmeras camadas de vozes, processadas eletronicamente, ela conseguiu recriar um ambiente intenso e misterioso, que apesar de não ser algo novo, soa extremamente estranho aos nossos ouvidos ao extrapolar os limites sônicos da voz humana. O vídeo foi originalmente gravado para ser parte integrante da instalação Versations Tetralogia, da artista plástica islandesa Gabriela Fridriksdottir, que foi exibido na Bienal de Veneza em 2005. Os sussurros graves de Mike Patton na música causam ainda mais apreensão.

“Pagan Poetry” (2001)

O vídeo desta música pode não ser um dos mais visualmente interessantes da cantora, mas apresenta a brilhante parceria entre o fotógrafo Nick Knight, que dirigiu o vídeo, e o estilista Alexander McQueen. O videoclipe causou polêmica e foi até censurado por conter cenas de nudez, pérolas e piercings sendo enfiados em partes do corpo e momentos íntimos da cantora com o seu marido, Matthew Barney. As imagens distorcidas e abstratas se misturam com a dramatização da cantora, que transmite a intensidade da canção. Esta não foi a única parceria do trio que já trabalharam juntos na capa do álbum Homogenic (1997), onde McQueen ainda dirigiu o videoclipe para a música “Alarm Call”, entre outros trabalhos realizados.

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