TODOS E TUDO EM DRIVE, SÉTIMO FILME DE NICOLAS WINDING REFN, RESPIRA E TRANSPIRA ESTILO NUM UNIVERSO AMBÍGUO, onde nada é o que parece ser, ou o que o espectador espera. Existem determinados tipos de visão e tratamento utilizados em determinados gêneros cinematográficos. Neste caso temos drama, romance e ação. Suspense. E um filme de gângsters. É quando percebe estes estilos de maneira nova e particular que Refn consegue fazer de Drive um filme que ultrapassa qualquer gênero para falar sobre seus personagens de uma maneira cuidadosamente elaborada e que arrebata o espectador.
É estranho como há uma atmosfera de novidade do começo ao fim do filme. Alguns elementos são bem reconhecíveis. Tarantino costuma fazer filmes em que o dado estilístico é um elemento criador da narrativa; David Cronenberg também fala da violência e da obscuridade como quem toma um chá das cinco; os irmãos Coen sempre colocam seus personagens misteriosos (e dúbios) em situações bem parecidas com aquelas vistas aqui; e até mesmo David Lynch cria situações quase surrealistas mas que carregam a urgência dos acontecimentos que capturam seus personagens. E é justamente por trazer um pouco de cada um destes elementos (e talvez tantos outros – fica a gosto do freguês), que Refn não é apenas um diretor que retrabalha referências. O diretor dinamarquês conquistou bilheterias e crítica (o filme lhe valeu o prêmio de melhor diretor em Cannes) justamente por não apenas sobrepor estilos, mas por ver com bons olhos aquilo que é clichê e transformar isto em seu instrumento para construir imagem e narrativa, onde a ousadia beira o kitsch e a história beira o non sense. Tudo ali é novo embora remeta a alguma coisa. Interessante exercício proposto para que assiste.
Os personagens são apresentados e colocados na história de uma forma rápida e econômica, trazendo para a narrativa apenas aquilo que é necessário para entendermos como aquela cadeia de acontecimentos engendrou um processo de descoberta do protagonista por parte do espectador. Ele não tem nome, apenas uma profissão: dublê de cenas de ação e nas horas vagas motorista que auxilia gangues em seus crimes. Não há envolvimento, não há contato com armas (as regras são muito claras, desde a cena inicial). Quem ele realmente é não saberemos. Mas saberemos, nestas entrelinhas que o filme se encarrega de escancarar, do que ele é capaz.
É quando este misterioso homem (vivido na medida exata por Ryan Gosling) decide ajudar a família de Irene (Carrey Mulligan) sua vizinha cujo marido acaba de sair da cadeia, trazendo uma dívida com bandidos que o obrigam a realizar um assalto: caso contrário sua família estaria em risco.
Lentamente vemos que a frieza (ou a compenetração excessiva) vai dando lugar à preocupação e ao envolvimento. Que motiva um
espírito violento e uma busca de justiça que irá até as últimas consequências sem pestanejar (reparem na cena em que o garoto guarda uma bala de revólver e toda luminosidade da cena se concentra nele, deixando o corpo de Gosling na penumbra – ali sua personalidade obscura começa a aparecer). É de certa forma um tipo reconhecível embora tornado originalíssimo. De onde vem aquela força, aquela capacidade de matar, aquela frieza? Ou… de onde vem este comprometimento em salvar uma família para mais tarde, entregá-la a outro homem?
Não há julgamentos em Drive, e não há espaços para isto. Só existem as motivações particulares de cada um dos personagens, que respondem à sua maneira às situações que se apresentam. E há Ryan Gosling misturando compaixão e impiedade, numa ambiguidade possível neste universo, e magistralmente bem representada na (sensacional) sequência do elevador. Herói e humano (como nos diz a trilha sonora que tem até Lovefoxxx!). E total subversão do típico cinemão americano com seus heróis invencíveis e donzelas indefesas. Um filme de gêneros e de personagens: isto é Drive.
Título original: Drive
Direção: Nicolas Winding Refn
Produção: Michael Litvak, John Palermo, Marc Platt, Gigi Pritzker,Adam Siegel
Roteiro: Hossein Amini, James Sallis
Elenco: Ryan Gosling, Carey Mulligan, Ron Perlman, Óscar Isaac,Christina Hendricks, Bryan Cranston, Albert Brooks, Kaden Leos,Jeff Wolfe, Russ Tamblyn
Lançamento: 2011
Nota: