Vou começar a história chamando nosso personagem por ele ou o homem de preto. Porque seu nome tanto faz, afinal o Zé trabalha como vigilante e – sejamos sinceros – quem olha para essa classe trabalhista. Comumente conhecido como o homem de preto. Ele é invisível assim como outros tantos trabalhadores. É parte de uma grande massa de funcionários que é fundamental dentro das empresas, porém não é vista e mal recebe um agradecimento ao final do serviço.
Ele, nosso vigilante, faz parte da classe dos trabalhadores invisíveis. A mesma das empregadas domésticas, copeiras, motoristas, garis, entregadores, lixeiros, atendentes e a lista segue adiante (peço desculpas, se deixei alguma de fora da lista). Nesse mundo de tantas injustiças, de injustiçados, esse tipo de tratamento não é nenhuma surpresa. Também o que representa um vigilante num país de políticos corruptos chafurdados na lama? Em uma nação que a imagem é a moeda de troca para pertencer ou não pertencer à sociedade. Aqui, ela vale literalmente mais do que 1.000 palavras. Assim acontece com nosso Zé e tantos outros colegas que cuidam do patrimônio alheio, que carregam a difícil tarefa de zelar por objetos que não são seus, muitas vezes arriscando a própria vida, e mesmo assim não é notado, que dirá reconhecido. Ele não pertence, simplesmente. É o cidadão sem rosto, sem nome, é apenas o cara da segurança ou, ainda, o homem de preto. Ah, minto! Existe uma situação em que é lembrado: quando ocorre um roubo ao patrimônio no qual estava sob sua responsabilidade! E agora, Zé? Então, ele é bombardeado de questionamentos sobre o acontecimento. Onde você estava? Por acaso estava dormindo? Quem vai arcar com tamanho prejuízo? Blá, blá, blá.
Nosso vigilante dá duro, troca o dia pela noite, e suas olheiras são tão profundas, que logo se percebe os anos de sacrifício para ganhar o tal adicional noturno. Rotineiramente ainda se esforça para fazer cara de malvado, porque dizem que assim impõe respeito, mas quem disse que ele é assim? Tão manso e amoroso, nosso personagem é daquele tipo de sujeito que se derrete com os afagos da esposa e abraços do filho – quando consegue encontrá-los – e, mesmo com a rudeza da vida, não perde a doçura no olhar que lhe é habitual.
Ele sonha com o dia em que será reconhecido. Será que é pedir muito? Quem sabe, não é? Sonhar não custa nada, já diz o ditado. Enquanto isso, toda tarde veste seu terno preto e calça seus sapatos surrados de tanto andar e ficar de pé, preparando-se para mais uma jornada de vigilância. Resignado em sua condição de invisível homem de preto, nosso valente trabalhador segue o trajeto pensando que, no final do mês, vai ganhar um bônus das horas extras e, finalmente, vai conseguir pagar a entrada de um carro para levar a família à praia. Claro, quando conseguir tirar uma folga, que sabe lá quando vai acontecer?! Tomara que logo, Zé! Tomara!