Review: Coringa

coringa posterTrazer para a tela grande um personagem dos quadrinhos sempre é um desafio, especialmente um vilão tão complexo e já tão retratado como é o caso do Coringa, o maior arqui-inimigo de Batman, da editora estadunidense DC Comics. Foi esse desafio que o diretor Todd Phillips (Se Beber Não Case) aceitou ao dirigir Coringa (Joker, 2019), na companhia do incrível Joaquin Phoenix no papel do protagonista. 

 

Na Gotham City da década de 1980, Arthur Fleck é um comediante de stand-up fracassado e que trabalha também como palhaço para uma agência de talentos. Ele mora com sua mãe, Penny Fleck, que é doente e de quem é também o seu único cuidador. Fleck que possui, assim como a mãe, transtornos mentais, tem uma agenda semanal com uma assistente social, que o auxilia a conduzir o seu precário tratamento psiquiátrico que, em determinado momento, é descontinuado.

 

Em meio a uma cidade imersa no caos, decadência e violência, Fleck, que é uma pessoa solitária e desajustada socialmente, vai transformando a sua vida até então pacata e tediosa, em uma vivência transgressora e criminosa, fruto de uma sociedade excludente e que o negligencia. Além disso, a convivência diária com a mãe, que é portadora de sofrimentos mentais assim como o filho e que, conforme a trama vai se desenvolvendo, também se revela uma mãe abusiva, leva Fleck a vivenciar experiências traumáticas e que o perseguem já na vida adulta.

 

O diretor e roteirista Todd Phillips, responsável pela trilogia Se Beber, não case!, consegue trazer à sua narrativa um Coringa sob uma vertente mais humana do que estamos acostumados em outras obras cinematográficas e, nesse sentido, adentramos mais na face da loucura do personagem. Loucura essa que, aliada à exclusão social que Fleck também está imerso e aos momentos em que é espancado e humilhado, não há como não sentirmos insatisfação e raiva e, em maior grau, terminamos por sentir também empatia por ele.

 

Arthur Fleck representa, ao longo de sua trajetória, o cidadão de Gotham City em seu extremo: sem emprego, sem esperança e excluído por ser doente mental. Em uma de suas várias falas emblemáticas, ele traz que “a pior parte de ter uma doença mental é que as pessoas esperam que você se comporte como se não tivesse”. Impossível não associarmos isso com o que historicamente as sociedades fizeram com os loucos, trancafiando-os em manicômios, longe das vistas do “cidadão de bem” e apartados, de forma que não fossem motivo de perturbação social.

 

Além disso, toda a construção do roteiro e do personagem na obra é traduzida de forma brilhante pela atuação de Joaquin Phoenix, que foi contemplado com  um merecido Oscar de Melhor Ator, por sua memorável e inesquecível performance. 

 

Por tudo isso e muito mais, Coringa é um filme excepcional, com um enredo muito bem montado e momentos marcantes, como a sequência icônica da dança de Fleck na escada. Coringa nos envolve do início ao fim em uma trama perturbadora e sombria, que traz uma crítica social e política ácida e muito contemporânea. É um filme, simplesmente, imperdível.

 

Por Natalia Ferri