Um mês se passou e cá estamos de volta à essas páginas embriagadas, para a infelicidade de muitos, porém para a felicidade de uma minoria que se vê escrava de uma ditadura cinematográfica, um fardo que ninguém merece carregar sobre as costas.
Esta segunda edição vem com alguns acréscimos nas pontas que ficaram meio perdidas em um projeto piloto que dificilmente, em qualquer caso, seria perfeito; atendendo inclusive às críticas de leitores da edição passada. Indo diretamente ao ponto da ferida que queremos tocar desde o início, que é basicamente essefrisson da crítica quando algum predileto da mesma lança uma obra, vamos oportunamente falar sobre o Quentin Tarantino. Ele está lançando a sua nova obra Django Livre, que, numa expressão que se popularizou muito por aqui na última edição, nos está sendo empurrada “goela abaixo” pela indústria cinematográfica.
Antes de comentar pontualmente sobre alguns filmes (o que aqui será possível, já que a obra do autor é menos extensa que a do Woody Allen), vamos falar sobre um padrão que se repetirá muito por essas linhas, a crítica contra a zona de conforto e o mais do mesmo. É bem verdade que todo diretor ou roteirista possui sua forma peculiar de trabalhar e seus próprios maneirismos, mas daí a repetir fórmulas e personagens (e pasmem, com os mesmos atores), só porque deram certo, é realmente lastimável. E é dessa forma que enxergo Tarantino. De longe, a maior crítica que tenho para fazer de seu trabalho é a repetição de fórmulas e a incansável auto-referenciação.
Quando digo isso é porque em algum momento tudo deu muito certo, alguma fórmula vingou incrivelmente. Gosto de pensar que foi em Pulp Fiction, que deixo bem claro aqui considerar uma grande obra de Tarantino, com um dos melhores roteiros de cinema que já vi. As reverências e referências aos grandes nomes do cinema, o roteiro não linear, seus extensos e inteligentes diálogos cults, a violência como forma de choque e de catarse, a impecável edição de Sally Menke, a utilização de músicas menos conhecidas em suas trilhas sonoras…
A maioria dessas pedras já haviam sido cantadas em Cães de Aluguel (o qual também é muito bom, diga-se de passagem) e foram glorificadas em Pulp Fiction, já que nesse último, os personagens têm um apelo popular muito mais forte. E é bom falar em personagens e relembrar esse tempo em que Tarantino realmente se dava ao trabalho de construí-los, em que eles eram politizados e inteligentes. Um tempo em que os textos não eram dados simplesmente para os atores, que ficavam incumbidos de dar a ele uma forma mais visível.
A péssima sequência de Kill Bill, assim como Jackie Brown, veio para nos dar a certeza de que Tarantino é sim roteirista de um filme só (ou no caso, dois), e para evidenciar que ele não possui nenhuma intenção de abrir mão das fórmulas que construiu. A caricaturização dos personagens é algo que começou a me irritar profundamente a partir de Kill Bill. Parece que é tudo uma historinha, um conto de fadas… Fantasias da mente adolescente de Tarantino. Mente esta que muitas vezes peca ao deixar de reverenciar os seus ídolos para copiar ou plagiar os mesmos.
Assimilando com muita calma todas essas críticas à obra de Tarantino, lembro realmente de ter me surpreendido em 2008, quando soube que o diretor lançaria um filme com conteúdo histórico e que, pasmem, não teria máfia envolvida: Bastardos Inglórios. Qual não foi a minha grande decepção ao assistir ao filme e notar que ele sacrificou as bandeiras históricas, sacrificou um roteiro mais elaborado por estilismos próprios, para dar lugar à repetição dos seus próprios devaneios (como toda a história de vingança do capítulo I).
Estéticas próprias de câmera, trilha, diálogos e humor desvalorizam o filme, sendo mal inseridos no contexto. Trilhas sonoras atuais em uma história de época, humor caricatural inserido apenas para fazer o público rir… Enfim, tudo apenas porque ele sabia que era de fácil identificação com o seu público. Destaca-se novamente aí a repetição de fórmulas, e a imersão no seu mundinho, do qual nunca irá sair enquanto houver milhares dispostos a gastar dinheiro com seus filmes.
No mais é isso, meu caro leitor, da próxima vez em que os seus companheiros te convidarem para aquela maratona de Tarantino, responda pausadamente algumas sentenças: “Ele (a) se vinga no final.”, “Obrigado, mas já ouvi David Bowie a semana inteira” e por último “Já briquei muito de atirar ketchup quando era criança, não preciso do Tarantino me mostrando como se faz”.
Filmografia Quentin Tarantino comentada no Cinema de Buteco:
Cães de Aluguel – por Flávia Andrade ; por Marcos Xi
Pulp Fiction – por Tainã Senna
Jackie Brown – por João Andrade
Grand Hotel – por Fred Borges
Kill Bill: Volume 1 – por João Andrade
Kill Bill: Volume 2 – por Wendel Wonka
À Prova de Morte – por Joubert Maia
Bastardos Inglórios – por Wendel Wonka; por Joubert Maia
Apresentando a coluna Sem Limão nem Gelo!: Existem filmes que aparentemente são obras de arte inquestionáveis para a maioria dos cinéfilos, porém descobrimos a existência de um senhor que se recusar a enxergar qualidade em obras de alguns dos principais cineastas de todos tempos. Tudo bem, afinal ninguém precisa gostar de tudo, mas essa figura se destaca por seu rancor.
Com tantas opiniões polêmicas, não deu outra: encontramos o Seu Germano tomando a sua tradicional cachaça no bar da esquina e o convidamos para desabafar sobre “certas verdades do cinema que ninguém quer aceitar”, como ele mesmo gosta de dizer. Lembrando que os textos refletem apenas a opinião do autor.
Edições anteriores: #1 – Woody Allen
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