O Cinema de Buteco adverte: o texto a seguir possui spoilers e deve ser apreciado com moderação
QUENTIN TARANTINO AFIRMOU QUE O GRANDE GOLPE FOI UMA DE SUAS PRINCIPAIS INFLUÊNCIAS ENQUANTO ESCREVIA O ROTEIRO DE CÃES DE ALUGUEL. Ambos os filmes contam a história de um engenhoso assalto sob várias perspectivas diferentes. Além, claro, dos criminosos ficarem bem longe de qualquer final feliz. Se o crime compensa ou não, tanto faz. O mais importante é que O Grande Golpe é um noir indispensável para os fãs do gênero.
Um criminoso decide planejar um último grande roubo antes de se aposentar e casar com a paixão de sua vida. Johnny reune um grupo nada comum de ladrões e organiza um ousado golpe durante uma corrida de cavalos. Para isso, ele precisará da ajuda providencial de um dos funcionários do Jockey. O problema é que o pobre George é um sujeito fraco e dominado pela esposa vil, que descobre os detalhes sobre o crime e conta tudo para o amante.
Apesar de contar com a direção de Kubrick, o longa-metragem não escapa ileso de certos problemas. O principal deles é a utilização constante (e às vezes completamente desnecessária) de um voice over para dizer para o público o que está acontecendo na tela. Talvez seja proposital para aumentar o clima de uma clássica história policial, mas chega a ser chato.
Um dos detalhes que mais me chamou a atenção foi a montagem não linear. As histórias dos personagens são apresentadas separadamente num ritmo envolvente. O espectador fica curioso em se aprofundar nos detalhes do crime perfeito, deixando-se levar pelos carismáticos “heróis”. Cada um deles desempenha uma função importante na trama, e o interessante é que nenhum deles é capaz de fazer o espectador perder a vontade de acompanhar o desenrolar do plano. Imagino que isso possa ter causado um pouco de confusão na mente do público da época, mas deixou um legado a ser seguido por toda uma legião de cineastas, como por exemplo Christopher Nolan, em Following e Amnésia.
Os últimos cinco minutos de O Grande Golpe são de tirar o fôlego. Johnny está com Fay no aeroporto e acaba sendo obrigado a despachar a sua mala com o dinheiro do roubo. Contrariado, ele observa o momento em que um maldito poodle invade a pista dos carrinhos que levam as bagagens para o avião e causa um improvável acidente: justamente a mala com o dinheiro é derrubada no chão. Pode até parecer meio careta do roteiro de Kubrick, mas o momento em que Johnny se recusa a fugir resume bem o espírito de O Grande Golpe: não adianta fugir.
A grande mensagem do filme é que certas mulheres crueis são capazes de arruinar profundamente a vida de um homem fraco. Se por um lado assistimos a femme fatale traindo o marido (o qual ela não considerava nem mesmo como um homem) e recebendo a sua lição, por outro temos Fay causando uma pressão inconsciente no pobre coitado do Johnny, que acaba se dando mal. Certo. Eu sei que a mensagem verdadeira é dizer que os criminosos merecem se danar, mas vai dizer que não faz sentido acusar as garotas de serem as grandes vilãs de O Grande Golpe?
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